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CRP-RJ presente em workshop sobre pessoas LGBTI privadas de liberdade


Data de Publicação: 3 de maio de 2018


Por Maiara Fafini

O CRP-RJ esteve presente, nos dias 25 e 26 de abril em Brasília, no Workshop: “Pessoas LGBTI privadas de liberdade – entre a invisibilidade e a estigmatização”, sendo representado pela psicóloga e coordenadora do Eixo de Diversidade Sexual e de Gênero da Comissão Regional de Direitos Humanos do CRP-RJ, Maiara Fafini (CRP 05/43721).

O evento foi uma iniciativa da Associação para a Prevenção da Tortura – APT e contou com a participação de profissionais de vários estados do Brasil envolvidos no combate à tortura e à violência, e na defesa dos direitos humanos das pessoas LGBTI privadas de liberdade.

Inicialmente, foi lembrado aos presentes de como a invisibilização e a estigmatização são dois polos que caracterizam aquilo de que sofrem as pessoas privadas de liberdade. Mas, se por um lado, há grandes preconceitos, por outro lado, hoje há grande interesse nessas temáticas. E é nesse sentido que vários projetos têm sido implementados no mundo. Por exemplo, o texto “Pessoas LGBTI privadas de liberdade” é um documento de referência sobre o direito das pessoas LGBTI privadas de liberdade em vários países.

maiara 1Dentro do cárcere há poderes paralelos e hierarquias. E abaixo dessas hierarquias estão as pessoas LGBTI. Então não há uma solução única para a situação dessas pessoas, como é o caso da criação de espaços segregados para protegê-las, mas que podem ao mesmo tempo torturar. Nesse cenário, se destaca de modo ainda mais delicado a situação das pessoas trans (travestis e transexuais). Um dos aspectos importantes, é o de dar o direito a essas pessoas de escolherem o local em que querem cumprir a pena.

Foram relatados vários casos de situações em que pessoas LGBTI foram (ou ainda estão) passando por situações de violências dos mais diversos tipos no sistema prisional brasileiro. Eis alguns exemplos:

  1. No Distrito Federal, houve o caso de um agente penitenciário que obrigou um rapaz gay a se deitar no chão e que 30 colegas de sela pisoteassem seu corpo. Quem desobedecesse o agente, seria punido. O agente foi afastado, mas hoje deve estar em outra unidade.
  2. No Rio Grande do Sul, várias travestis foram transferidas de um presídio para outro, de segurança maior, sem serem consultadas se gostariam de ir, e não queriam a transferência. Sofreram abandono familiar, pois suas famílias não tinham como se mudar para o local do novo presídio para visitá-las. Como se não bastasse, na mudança do antigo presídio para o novo, foram queimadas todas as suas roupas femininas e as vestiram com uniformes masculinos e cuecas.
  3. No Ceará, um rapaz preferiu suportar a tortura da solitária a ter que ficar junto aos outros, pois não aguentava mais ser violentado.
  4. Também no Nordeste, foi citado um caso de uma mulher trans que acordava molhada de esperma dos outros presos, que ejaculavam nela durante a noite, enquanto ela dormia.

Foi feita uma retrospectiva dos primórdios do sistema de aprisionamento no Brasil para identificar quem foram esses corpos disciplináveis, torturáveis e matáveis. Primeiro foram os corpos de indígenas (homens, mulheres e jovens), seguido dos corpos dos africanos, pois através do exercício da dor tirava-se a força necessária para o desenvolvimento de uma nação. No ordenamento jurídico e social pós-república e pós-abolição, houve o disciplinamento dos corpos de negros, indígenas, mulheres, pessoas com deficiência (muitas tidas como loucas) e LGBTI. Nas décadas de 20, 30 e 40, foi a vez de negros, prostitutas, homens com tatuagens, gays pessoas com transtornos mentais e todas(os) que não estavam no modelo de normalidade. As justificativas são diversas, mas a intenção (quase sempre velada) é de cunho moral, em nome do “bom comportamento”, e quem é imoral tem que ser curado nas instituições totais.

maiara 2Nesse contexto, pessoas LGBTI são tidas como inadequadas e com comportamentos inaceitáveis e, por isso, são discriminadas no sistema prisional. Por exemplo, duas mulheres juntas é falta grave em qualquer presídio feminino. Quando são vistas de mãos dadas, são colocadas em celas separadas, pois têm de ser disciplinadas, aprender a se adequar às normas. Mas, que normas? Ninguém sabe dizer. Travestis e transexuais são o maior público de assédio sexual. Corta-se o cabelo delas e não deixam que pintem nem cabelos nem unhas. Os homens trans – além de serem os mais invisibilizados –, quando querem andar de mãos dadas com outras mulheres, são espancados “como homens” para lhes “ensinar a virar homem e para saberem como se trata homem”.

Um gay do candomblé não tem assistência religiosa porque uma mãe de santo não tem permissão para entrar (ao contrário de outras religiões em que é permitida a entrada de líderes religiosos no presídio). O mesmo acontece com as travestis que, em sua maioria, também são de religiões de matriz africana. Isso sem contar com a força das religiões conservadoras dentro das prisões e que, não raro, discriminam as pessoas LGBTI. As facções não aceitam homossexuais. Nem trans. Para preservar a vida dessas pessoas, o único remédio é a solitária, por mais terrível que seja.

E não se pode alegar nem que a perseguição é por causa do crime. Pois quanto pior é o crime, maior a consideração que a pessoa tem na cadeia. O que não acontece com as pessoas LGBTI, já que os crimes cometidos por elas são, em sua maioria, relativamente leves (rápidos e imediatos), então, a punição não é pelo crime em si, mas por ódio àquilo que a pessoa representa. Se for lésbica, gay ou trans, é pervertido(a), e se, além disso, for negro(a), então é safado(a) e pervertido(a). Veredito: inimigos em potencial.

 



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