Por Marta Chagas (CRP 05/7352), psicóloga junguiana
Falar sobre Carlos Bernardi não é uma tarefa fácil! Apesar da longa convivência que tivemos — foram quase 40 anos de contato muito próximo —, é difícil escolher o que contar sobre esses 62 anos de sua existência… Mas considero importante tentar deixar registrados alguns pontos sobre sua trajetória.
Carlos nasceu na Lapa, na cidade do Rio de Janeiro, “com muito orgulho”, dizia ele, no último dia do ano de 1955. Descendendo de italianos, por parte de pai, e de espanhóis, por parte de mãe, essa mistura sempre foi marcante em seu caráter (no sentido hillmaniano): era alegre, explosivo e intenso. Morou e trabalhou grande parte de sua vida em Niterói; somente no início dos anos 2000 mudou-se pra sua querida cidade natal.
Formou-se na Universidade Santa Úrsula, em Botafogo, como psicólogo clínico em 1978. Durante o curso, teve seu primeiro contato com a Psicologia de Carl Gustav Jung através de uma palestra. A partir de então, dedicou-se inteiramente ao estudo da teoria junguiana. Trabalhou como monitor em Terapia Ocupacional na Casa das Palmeiras, junto à grande psiquiatra Nise da Silveira, sempre participando de seus grupos de estudo, assim como de eventos e grupos no Museu do Inconsciente.
Em 1979, trabalhou na Clínica Psiquiátrica Santa Catarina, no município de São Gonçalo, onde montou um setor de Terapia Ocupacional para trabalhar com os pacientes internados lá. No ano seguinte, montou outro setor de Terapia Ocupacional no Hospital Colônia Teixeira Brandão no município de Carmo (RJ). Durante esse tempo, já havia começado a trabalhar em consultório particular como psicoterapeuta junguiano, além de coordenar vários grupos de estudo.
Outras características importantes de Carlos: sempre foi muito inteligente, estudioso, criativo e generoso quanto a seu conhecimento. Sempre excelente professor, nunca “escondeu” suas descobertas e paixões teóricas das pessoas que estudavam com ele — sempre indicava leituras, os autores, e fazia todas as conexões de pensamentos sem ficar “escondendo” tais referências.
Foi assim que, nos anos 80, encontrou o pensamento de James Hillman, importante junguiano americano, aprofundando-se rapidamente em sua teoria e levando a seus grupos de estudo esses novos fundamentos. Nos anos 90, Carlos organizou vários eventos como ciclo de palestras, cursos sobre a Psicologia Junguiana; em 1997 criou a Rubedo, uma página na internet de grande visibilidade que continha textos variados, resenhas de livros e filmes, obras de arte, entrevistas etc. O ano de 1993 foi decisivo para ele: o nascimento de sua filha Melissa o transformou, para sempre, em pai.
Fez mestrado em Literatura Portuguesa, cuja dissertação traçava um paralelo entre os heterônimos de Fernando Pessoa e a Psicologia arquetípica de James Hillman; seu doutorado foi em Literatura Comparada, em que escolheu os filósofos Jacques Derrida e Emmanuel Lévinas como interlocutores da Psicologia arquetípica.
Além de seu trabalho como analista, também se realizou como professor: deu aulas no Instituto de Teologia de Petrópolis; posteriormente, até seu falecimento, foi professor e supervisor do Curso de Psicologia da Universidade Estácio de Sá e também da Pós-graduação em Psicologia Junguiana da PUC-Rio.
Carlos Bernardi realmente foi uma pessoa de grande valor: como ser humano, como pensador, como professor, como amigo e incentivador. E como era querido por muitas pessoas! Quantas mensagens importantes, carinhosas, recebeu de tantas pessoas, todas querendo dizer algo sobre ele… Como era amado!
Carlos adorava viajar, adorava fotografar… Parece que um ciclo se fechou: acabou falecendo no retorno de sua última viagem, durante um carnaval, cremado numa Quarta-Feira de Cinzas… Muitas coincidências, muita sincronicidade: nascer e morrer durante festividades! Certamente todo mundo deve estar dizendo: “ah, mas isso é a cara do Carlos!”.