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“Felicidade e Adoecimento” é tema da última mesa de debates da 11ª Mostra


Data de Publicação: 28 de julho de 2017


A última mesa de debates da 11ª Mostra Regional de Práticas em Psicologia mobilizou, na manhã do dia 21 de julho, as (os) participantes do evento para pensar e discutir a temática “Felicidade e Adoecimento”. Mediada pelo conselheiro do CRP-RJ Thiago Melício (CRP 05/35915), a mesa contou com as falas de Rossano Cabral Lima, psiquiatra e professor da UERJ, Ana Paula Lopes (CRP 05/50805), professora do Departamento de Psicologia do Trabalho da UFF, e Fernanda Pimentel, psicanalista e professora do curso de Pós-Graduação em Psicanálise e Cultura da Universidade Celso Lisboa.

“Esse é um tema tão interessante quanto urgente”, declarou Fernanda Pimentel, dando início ao debate. “Temos a necessidade de pensar as questões voltadas para a felicidade e o adoecimento numa época em que a felicidade tornou-se uma obrigação, um imperativo. Vemos nas mídias sociais e na mídia em geral o excesso de imagens de pessoas felizes e a propagação da ideia de que se você não é feliz a culpa é sua, é você que está fazendo alguma coisa de errado, já que a contemporaneidade oferece várias ferramentas para sermos felizes”.

IMG_2125Para a psicanalista, é preciso questionar a ideia que opõe felicidade e adoecimento. Segundo ela, nessa lógica binária, aproxima-se a ideia de felicidade a de prazer e de adoecimento a de desprazer.

“Temos acesso, principalmente em nossos consultórios, a diversas situações onde essa lógica de busca do prazer e da felicidade cai por terra. Freud já dizia que não é possível viver exclusivamente em prol do princípio do prazer e da felicidade. Há algo para além do prazer, para além da felicidade. Vemos isso na nossa clínica, onde os sujeitos apresentam sintomas e se veem em situações muito persistentes que, na verdade, trazem mais desprazer do que prazer e felicidade”, argumentou.

“É preciso transformar a oposição entre estes termos: felicidade versus adoecimento, prazer versus desprazer, satisfação versus sofrimento, como se, para ter felicidade, você necessitasse não estar envolvido em nenhum processo de adoecimento”, finalizou Fernanda.

Rossano, por sua vez, buscou em sua fala fazer uma costura entra os conceitos de felicidade e adoecimento com a questão da medicalização, mostrando de que forma essa situação “aponta para um certo ideal de felicidade e normalidade presente entre nós”.

Conforme explicou, a noção de medicalização é mais ampla do que a questão medicamentosa. Segundo ele, a medicalização compreende um “processo onde fenômenos sociais e subjetivos passam a ser descritos em linguagem médica e encarados como quadros patológicos e passíveis de abordagens terapêuticas”.

“Tomando pelo campo da Saúde Mental, mais especificamente o campo da Psiquiatria, a medicalização não é nenhuma novidade. A própria constituição do campo da Medicina Mental, posteriormente chamada de Psiquiatria, é herdeira de um ato de medicalização, ou seja, de transformação do fenômeno social da loucura em doença mental”, contextualizou Rossano.

Segundo apontou o psiquiatra, os principais motores nesse processo de medicalização da vida como fenômeno social são, entre outros, o prestígio, poder e autoridade do saber médico, a transformação do campo farmacológico em uma rentável área de negócios, o desenvolvimento das biotecnologias e o desenvolvimento da neurociência.

“No campo infância, você encontra uma grande adesão dos próprios pais aos discursos medicalizante em relação aos problemas dos filhos. A partir do momento em que há um sinal de que algo do ponto de vista emocional, comportamental e cognitivo vai mal, o que temos visto é uma procura do diagnóstico como uma primeira explicação e do remédio como um primeiro recurso terapêutico”, afirmou ele.

“Não há apenas um ideal de normalidade, mas um ideal de felicidade que opera por trás. Ao que parece, a felicidade é um ideal que só pode ser atingido quando a pessoa se submete a um ideal de normalidade difundido pelos saberes dos especialistas”, defendeu Rossano.

IMG_2146Encerrando as falas da mesa, Ana Paula abordou a temática “Felicidade e Adoecimento” no contexto do trabalho. Ela falou brevemente sobre a pesquisa que desenvolve na UFF e que tem como tema “O trabalho como operador de saúde”.

“Quando falamos em trabalho, é muito difícil pensarmos a relação entre trabalho e felicidade ou trabalho e promoção de saúde. É mais fácil pensarmos o trabalho como modo de produção de adoecimento, sofrimento e morte”, declarou.

A psicóloga citou o filósofo alemão Karl Marx, que definiu trabalho como “atividade de transformação do homem sobre a natureza”. “À medida que o homem faz isso, ele também se transforma nesse processo de relação com a atividade de trabalho. Já nesse conceito, há uma concepção de subjetividade, segundo a qual é a partir da nossa atividade de trabalho que nos construímos como sujeito. Essa noção de trabalho implica uma noção de trabalho como criação de si e de mundo”, analisou.

Em seguida, Ana Paula mencionou dados impressionantes da Organização Internacional do Trabalho, que estima que, anualmente, 4 milhões de pessoas morrem em função do trabalho. “Não estamos falando de pessoas que adoeceram, mas apenas das que morreram. Então, se induzimos um dado maior sobre todo o processo de adoecimento e morte das pessoas que trabalham, temos um quadro extraordinariamente caótico em relação à realidade no Brasil e no mundo”, argumentou.

“Nossa pesquisa opera no sentido de tentar compreender em que aspectos do trabalho produz-se saúde, satisfação, realização pessoal e reconhecimento”, continuou a psicóloga. “Curiosamente, o não trabalho também pode gerar adoecimento. O desemprego, em especial em longo prazo, pode gerar situações psicopatológicas para aquelas pessoas ou mesmo, em alguns casos, a possibilidade de aposentadoria pode gerar adoecimento”.

A professora da UFF também problematizou o próprio conceito de saúde. Segundo ela, “saúde não é meramente a ausência de doenças. É preciso avançar neste conceito. A Organização Mundial da Saúde tem um conceito muito interessante que diz que a saúde é ‘um completo estado de bem-estar físico, mental e social’. Bonito, né? Agora, como obter esse completo estado de bem estar que, na prática, não existe?”.

Você pode assistir à integra do debate em nosso canal do Youtube clicando aqui.



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