O CRP-RJ aproveita o dia Mundial da Saúde, 07 de abril, para abordar o tema escolhido pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em 2017. “Depressão: vamos conversar”, é exatamente o que estamos estimulando. Nesse sentido, entrevistamos a presidente da Comissão de Psicologia e Saúde do CRP-RJ, Rita Louzada.
Na conversa, ela fala sobre o cenário da depressão no mundo e no Brasil, além de apontar algumas ações para tentar tratar a doença. Fala também sobre a formação dos psicólogos e as principais necessidades da categoria. Segundo ela, temos uma sociedade muito desigual e por isso os serviços do Sistema Único de Saúde (SUS) precisam funcionar bem.
Enquanto psicóloga, o que é mais relevante destacar em relação à saúde das pessoas nos dias de hoje?
Nos dias de hoje, a impressão é que a crise, que vivemos em nosso país, tem impactado fortemente a vida e a saúde das pessoas. Não temos como afirmar de modo definitivo, porque as pesquisas não são realizadas de modo ágil, como sabemos. Elas exigem tempo de planejamento, submissão a Comitês de Ética, tempo para a aplicação de protocolos. E isso termina exigindo de nós também certa espera para que venham dados conclusivos.
Alguns estudos indicam um aumento mundial da depressão nas últimas décadas, esse tema inclusive foi escolhido pela Organização Mundial da Saúde (OMS) neste ano. A que se atribui isso, no sentido da saúde mental das pessoas, e qual o cenário brasileiro?
Sim, a OMS tem apontado para o crescimento dos casos de depressão no mundo. Segundo acompanhamento realizado, de 2005 a 2015, os casos cresceram em 18%. É preocupante. No Brasil, segundo esse mesmo levantamento, temos cerca de 5,8% da população apresentando esse tipo de sofrimento.
No cenário brasileiro, temos as dificuldades de contexto, problemas sociais importantes, quem vêm impactando a saúde mental das pessoas. Não é incomum termos notícias de pessoas em sofrimento importante relacionados a desemprego, desproteção social. Mais que isso, temos uma dificuldade séria em relação ao acesso a tratamento. Com as políticas públicas desmontando, o acesso a tratamento fica ainda mais escasso.
É preciso mais diálogo sobre a depressão, mais informações nos meios de comunicações? O que é recomendável para prevení-la e remediá-la?
Sem dúvida precisamos incluir a depressão em nossas conversas cotidianas. Quem está se sentindo com o humor muito deprimido precisa buscar ajuda. E caso não consiga fazer isso por conta própria, as pessoas próximas devem ajudar.
Não sei se é possível falar em prevenção, mas podemos, sim, colocar mais o mal-estar em nossos diálogos. Este é um bom ponto de partida. Caso esse mal-estar seja algo para além da tristeza comum, para além do luto por uma perda recente, precisamos ficar atentos.
Em nosso país há necessidade absoluta de serviços públicos de saúde mental descentralizados e de qualidade, para atender casos desse tipo e outros no campo da saúde mental. A Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) precisa funcionar bem para evitarmos internações, para contornarmos as crises.
Temos uma sociedade muito desigual e por isso os serviços do SUS precisam funcionar bem. A depressão é um transtorno mental bastante complexo e há necessidade também de uma equipe multidisciplinar para cuidar de quem sofre. Portanto, precisamos de vários tipos de profissionais e serviços públicos de qualidade. Uma pessoa deprimida precisará de várias atividades e demandará vários tipos de saber e profissionais por perto.
Como você avalia hoje a formação e a atuação dos psicólogos? Os profissionais estão saindo das faculdades bem formados e prestando um bom atendimento à saúde das pessoas?
Isso depende da instituição. Mas sem dúvida é necessário que o curso possibilite, de um lado, ao estudante dominar o conhecimento psicopatológico relativo aos quadros depressivos, para fazer o diagnóstico com cuidado e, de outro, que reconheça as dificuldades de tratar sozinho uma pessoa com depressão. Em relação ao primeiro item – o diagnóstico da depressão – vemos que por vezes há uma demora nesse diagnóstico ou desconhecimento de alguns determinantes sociais desses quadros, como é o caso das algumas intoxicações laborais, que podem produzir depressão do humor. Neste caso, por vezes o afastamento do trabalho se faz necessário e fundamental. Portanto, há a necessidade de ajuda médica. Em relação ao segundo item – trabalho em equipe – observa-se que tanto no diagnóstico quanto na condução do caso, a possibilidade de discussão com outros profissionais se faz essencial para que as chances de melhora da situação de sofrimento aumentem.
Do ponto de vista da categoria, quais as principais bandeiras dos psicólogos hoje?
Levando em conta os psicólogos brasileiros que atuam na saúde, acho que hoje eles têm duas vias principais de trabalho: no consultório particular e no serviço público. Os primeiros se relacionam comumente com operadoras de planos de saúde e essa é uma relação de trabalho que merece atenção. Pagamentos de valores baixos desqualificam sobremaneira o profissional e trazem muitos desdobramentos indesejáveis na clínica.
Os outros psicólogos, que atuam nas políticas públicas de saúde, têm acompanhado o desmonte dessas ações e políticas, com a consequente desproteção e desassistência de seus pacientes. Vínculos de trabalho precários e salários baixos também precarizam a clínica. Tem sido algo grave e que impacta especialmente as populações mais vulneráveis.
Em suma, tanto na clinica privada como na saúde pública, há, em minha avaliação, necessidade de debater esses temas de modo mais claro e aberto.
(1) – Em reação a este item – intoxicações laborais – uma leitura importante é o capítulo relativo a transtornos mentais e do comportamento na publicação “Doenças relacionadas ao trabalho. Manual de procedimentos para os serviços de saúde” , que pode ser acessado neste link: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/doencas_relacionadas_trabalho1.pdf