Confira a nota do Conselho Regional de Psicologia do Rio de Janeiro
As comemorações de final de ano repetiram os habituais augúrios: boas festas, paz, saúde, sucesso, prosperidade… Nos jornais, o horror: uma onda avassaladora e espantosa de violência e barbárie. Por certo, para alguns, nada tenham entre si estes fatos, são isolados, não podem nem devem ser relacionados: o massacre na prisão de Manaus, o assassinato do embaixador grego no Rio de Janeiro, o feminicídio e a chacina de familiares e amigos numa comemoração de Ano Novo em Campinas, o brutal e covarde espancamento e morte de um vendedor ambulante no metrô em São Paulo (citando só os que tiveram maior atenção da mídia). Eles concretizam, no entanto, as tendências de um alarmante estado de coisas, o desprezo e a nenhuma valia da vida das pessoas, que tem como seu corolário e fundamento o aviltamento dos Direitos Humanos.
Os presos estão sob a guarda do Estado, têm o direito de serem protegidos por quem os detêm, mesmo que seja contra si próprios por conta dos conflitos entre as diferentes facções em que se organizam; o massacre só ocorreu porque o Estado deixou que se criassem as condições que o permitiram, como a entrada de armas, etc. O embaixador tinha o direito à vida, coisa incrivelmente esquecida e menosprezada nos tempos que correm. No episódio de Campinas, foi esmagado o direito de pessoas a resolverem suas questões e diferenças de modo pacífico e pela lei. E, talvez o fato mais ignominioso pela torpeza dos assassinos, a morte do vendedor ambulante em São Paulo por se atrever a defender o indefensável, uma travesti e seu direito à diversidade.
Nós, psicólogas(os), nossas entidades e organizações, devemos nos manifestar com dor, indignação e repulsa. Não é mais crível que se possa formular a pergunta, que cada vez mais se mostra falsa, diversionista, hipócrita mesmo: afinal, o que tem a Psicologia a ver com os Direitos Humanos? Tem tudo a ver, desde que não a vejamos como uma disciplina científica “pura, asséptica, neutra e objetiva”, ao reconhecermos sua inserção no âmbito humano e coletivo, uma Psicologia que defende o princípio e atua para que os sujeitos se autodeterminem, com autonomia e liberdade, em todos os ambientes sociais, na vida familiar, escolar, profissional; e são exatamente os preceitos dos Direitos Humanos um dos pilares fundamentais que garantem essas liberdades.
Apesar da perplexidade com a violência dos eventos destes últimos dias, sabemos bem que vivemos crescentes ataques contra a mulher, contra todas as diversidades sexuais, contra o cidadão comum por delinquentes e muitas vezes por agentes do estado, sendo estes também muitas vezes vítimas de atrocidades exatamente por esta sua condição. Como seres humanos, como profissionais, não haveria como sermos indiferentes a tal situação e nem imaginar que seriam fatos individuais que não interagem entre si.