No dia 17 de agosto, aconteceu em Nova Iguaçu o II Seminário em Comemoração ao Dia da (o) Psicóloga (o), lotando o auditório da Catedral Santo Antônio, localizada no Centro da cidade. Entre as 9h e as 14h, psicólogos que atuam em diferentes áreas palestraram sobre suas experiências, dando o tom do evento que, com o tema “A Psicologia e suas diversas práticas: na Elaboração de Documentos, na Assistência Social, na Saúde Mental , no Socioeducativo e na Educação”, antecipou o Dia da (o) Psicóloga (o), comemorado no dia 27 de agosto.
Conselheira-presidente da Comissão Intergestora de Regionalização e Descentralização (CIRD) do CRP-RJ, Vanda Vasconcelos Moreira (CRP 05/6065) abriu o evento, ressaltando tratar-se de um importante “momento com a categoria, com os estudantes, com as instituições parceiras” e apresentando aos presentes alguns dos colaboradores e instituições parceiras do CRP-RJ.
Também discursaram na abertura a conselheira Viviane Siqueira Martins (CRP 05/32170) e a coordenadora da Comissão Gestora da Subsede do CRP-RJ na Baixada Fluminense, Monica Valéria Affonso Sampaio (CRP 05/44523). “Nossa profissão é muito delicada, muito difícil no dia a dia, nos postos de trabalho onde atuamos. Muitas vezes nos vemos sozinhos nessa empreitada. É importante vocês saberem que podem contar com o CRP”, disse Mônica. Ambas ressaltaram o esforço do CRP-RJ em aproximar-se ao máximo da categoria e promover debates sobre questões inerentes à atuação das (os) profissionais de Psicologia.
Mesa de Abertura
“Hoje é um dia muito especial para nós, porque estamos consagrando muitas conquistas”, introduziu Vanda, durante a mesa inicial do Seminário. Ela fez referência, entre outras realizações, à reforma na casa da Subsede Baixada do CRP-RJ e ao aprofundamento nos últimos anos da relação do Conselho com universidades, motivo pelo qual estavam presentes no evento estudantes e professores de todas as universidades da região da Baixada, assim como das instituições parceiras.
Discursaram brevemente o psicólogo Achiles Miranda Dias (CRP 05/27415), integrante da Comissão de Psicologia e Assistência Social do CRP-RJ, e Daniel Coelho, presidente da Cruz Vermelha de Nova Iguaçu, onde a Subsede Baixada tem funcionado enquanto a casa encontra-se em reforma.
A coordenadora do Centro de Direitos Humanos da Diocese de Nova Iguaçu, Yolanda Florentino, falou sobre a parceria que vem sendo desenvolvida entre a instituição que integra e o CRP-RJ. “Eu sempre comparo a profissão de psicólogo à do sacerdote, por causa do sigilo, da ética, do compromisso, especialmente de vocês que exercem sua profissão nesse contexto sofrido da Baixada Fluminense”, disse ela, que destacou a relação entre psicologia e a luta admirável que vem exercendo pelos direitos humanos, ressaltando a importante parceria que vem acorrendo nos últimos anos do CDH- NI e o CRP-RJ através das atividades desenvolvidas na Subsede Baixada .
Encerrando a mesa de abertura do evento, o psicólogo Marinaldo Silva Santos (CRP 05/5057), presidente do Sindicato dos Psicólogos do Estado do Rio de Janeiro (SINDPSI-RJ), falou sobre a parceria com o CRP-RJ. “Nós vivemos muitos embates e muitos sucessos”, contou, abordando também questões trabalhistas, como piso salarial da categoria. “Entendo que nós temos que ter um piso salarial, um ganho mínimo, para que a questão salarial não fique nas mãos dos políticos. Nós ainda somos muitos desvalorizados nos órgãos públicos. Há concursos que oferecem um salário mínimo como remuneração”, criticou o sindicalista, que também falou sobre a luta da carga horária máxima de até 30 horas, transitando no Congresso em Brasília.
Primeira mesa de debates
Mediada pela conselheira do CRP-RJ e coordenadora da Casa da Cidadania do Jordão/RJ Viviane Martins, a primeira mesa de debates do seminário teve início com palestra da psicóloga Silvia Ignez (CRP 05/28424), doutora em Psicologia pela UFRJ, que falou sobre elaboração de documentos no Sistema Único de Assistência Social (SUAS), Saúde Mental e Sistema Socioeducativo.
“Se eu escrevo alguma coisa sobre alguém que eu atendo somente a partir de teorias e técnicas, tenho sempre que problematizar que teorias e técnicas são essas com que eu estou trabalhando”, disse Silvia, que é professora de Psicologia Jurídica na Faculdade IBMEC, na Faculdade Integradas Hélio Alonso (FACHA) e na Universidade Cândido Mendes (UCAM). “Quando eu problematizo isso, já estou no campo da ética”, completou.
“Outro ponto importante do relatório é opinar sobre quem você nunca atendeu: esta é uma infração gravíssima. Eu trouxe esse elemento porque vemos muitos colegas fazendo isso. É muito importante que você só fale de quem você atendeu presencialmente, com quem você realmente conversou”, pontuou a psicóloga.
A emissão de “juízo de valor”, segundo Silvia, também precisa ser evitada, por se tratar de uma “análise feita a partir de moral”, o que “é completamente diferente de quando se vai falar a partir de uma fundamentação teórica”. Durante sua explanação sobre a produção de documentos de avaliação psicológica, o que mais se ouviu foi a palavra “ética”.
Segundo a palestrar, Achiles Miranda Dias falou sobre “relações do Sistema de Justiça com a política de Assistência Social: debate sobre a Nota Técnica do SNAS/MDS nº 02/2016”, que, lançada em maio deste ano pela Secretaria Nacional de Assistência Social, trata da relação do SUAS com o sistema de Justiça.
Segundo o psicólogo da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social (SMDS) do Rio de Janeiro, tem ocorrido um “transbordamento do Judiciário sobre o SUAS, demandas do Judiciário que são estranhas às atividades e aos objetivos da Assistência Social”, de modo que o debate sobre a Nota Técnica faz-se fundamental.
“A ideia é nós, profissionais, nos apropriarmos dessa nota, e discutirmos com o órgão gestor, com as secretarias municipais, com a Secretaria Estadual da Assistência Social, e com o Judiciário”, disse Achiles, que explicou que a referida nota “descreve a natureza do trabalho social das equipes para subsidiar esse diálogo” entre os profissionais que atuam no SUAS e os órgãos do Sistema de Justiça. “Ela começa com todas as principais normativas, conceitos e princípios do SUAS, e coloca as seguranças que são afiançadas à assistência social como aquelas que definem a assistência social”, afirmou.
Depois de uma rodada de perguntas de profissionais e estudantes que compunham a plateia, que participou ativamente do seminário, houve um farto Coffee Break, após o qual teve início a segunda mesa de debates do evento.
Segunda mesa de debates
Com mediação da coordenadora da Comissão Gestora da Subsede do CRP-RJ na Baixada Fluminense e gestora do Centro de Referência de Assistência Social (CRAS) de Nilópolis, Monica Valéria Affonso Sampaio, a segunda mesa de debates do seminário contou com palestras dos psicólogos Giovanna Marafon, (CRP 05/30781), doutora em Psicologia pela UFF e professora da Faculdade de Educação da UERJ na Baixada Fluminense (FEBF), em Duque de Caxias, e Luís Carlos Felício (CRP 05/43796), que atua no Programa Municipal de Saúde Mental da Prefeitura de Paracambi.
Ao palestrar sobre o tema “Transversalizando Psicologia e Educação nas diversas práticas e Políticas Públicas”, Giovanna fez diversas críticas a formas de discriminação nos espaços de formação, sobre as formas de exclusão, e afirmou que “a escola é um espaço onde se produzem práticas muito racistas até hoje”. A professora integra o grupo de docentes da UERJ que tem se mobilizado intensamente contra a PEC “Escola Sem Partido”.
“A escola é um espaço que, pela sua sistematização e produção de práticas racistas, acaba segregando e excluindo muitos sujeitos, que saem da escola. E que, ao sair da escola, pelos motivos mais diversos, acabam saindo do alcance dessa que é as política pública mais universal que temos hoje”, disse a psicóloga. “Quando esses sujeitos saem da escola, em geral são capturadas por outras políticas públicas, a exemplo o Sistema de Justiça e, dentro dele, o Sistema Socioeducativo”, completou.
Giovanna também problematizou o fato de pouco se falar, dentro da Psicologia, “sobre o racismo e a expropriação de territórios indígenas, quilombolas, negros”. Para ela, “a Educação, a Medicina e a Psicologia contribuíram para invisibilizar essas diferenças” e, assim, para aprofundar desigualdades.
“A gente trabalha com modelos de ser humano e tem de se confrontar e enfrentar que, mesmo no campo da Psicologia, que é uma ciência humana, em termos de saberes e de prática profissional, a gente ainda está muito imbuído da ideia de um modelo de ser humano, que seria em absoluto um homem branco, ocidental, heterossexual. Em geral a gente não pensa e pouco produz conhecimento deslocando dessa figura que é uma norma de sujeito”, analisou a professora, que citou como exemplo a pouca visibilidade dada à produção de psicólogas e psicólogos negros, ou que não sejam heterossexuais ou ,ainda, pessoas com alguma deficiência, no campo da Psicologia.
Giovanna finalizou sua apresentação abordando o compromisso social da Psicologia diante das questões que colocou ao longo de sua explanação. “Me parece que o Sistema Conselhos tem conseguido, junto das universidades ou paralelamente, encontrando pontos de contato com as universidades, contribuir para outras produções no campo da Psicologia, principalmente dos anos 1990 e, mais especificamente, dos anos 2000 para cá, trazendo esses temas para o debate e relacionando-os às políticas públicas”, disse. “Acho que a atual gestão do CRP-RJ e a Subsede da Baixada têm feito isso com muita força e merecem esse reconhecimento, como também o CRP de São Paulo. Ambos têm produzido muita diferença”, encerrou.
Último a palestrar, Felício abordou “as práticas no processo de desinstitucionalização de Paracambi à realidade da conjuntura política atual na Saúde Mental”, iniciando sua fala com um breve histórico da questão da Saúde Mental. “A história da loucura não começa amparada pelos Direitos Humanos, por esse sentimento de empatia pela pessoa que sofre transtorno psíquico”, introduziu o psicólogo.
“Na verdade, ela começa com a questão da possessão demoníaca e a religião tomava conta disso tudo. Então, uma pessoa com transtorno mental naquela época era uma pessoa com possessão demoníaca, e aí ela era tratada de acordo com as questões religiosas daquela época”, continuou. Ele passou pela lógica moral que levou ao tratamento com práticas de tortura, como choques elétricos, lobotomia, banhos gelados, entre outras.
Seguindo a linha desse percurso histórico, ele pontua que, a partir do psiquiatra italiano Franco Basaglia, houve uma “transformação do saber”. “A gente começa a pensar a Saúde Mental, o transtorno psiquiátrico, de forma mais ampla”, pontua. “E, por último, temos a Reforma Psiquiátrica, que começou na década de 1980 e houve de fato essa enorme transformação dentro do campo da psiquiatria no Brasil”, completou.
“A luta antimanicomial não surgiu apenas para denunciar os manicômios como locais de maus tratos. Ela propõe a construção de uma rede de serviços, estratégias territoriais e comunitárias, de forma solidária, inclusive e libertária. E esses três constructos é que mantêm hoje em dia essa chama acesa. Os retrocessos são muitos, mas eu acredito que a chama ainda está acesa, porque tem muita gente lutando contra os retrocessos”, afirmou.
Depois de mencionar a importância do movimento de fechamento de hospitais psiquiátricos no final da década de 80 em São Paulo, Felício afirmou que fechar hospitais não é sinônimo de desinstitucionalização da Saúde Mental. “A desinstitucionalização é o que acontece quando a pessoa sai do hospital, e é fundamental a existência dos serviços substitutivos para que de fato possam ser empreendidos os processos de desinstitucionalização”, explicou o psicólogo.
“Imaginem um lugar com 3.500 pessoas internadas em pleno sofrimento. Além do sofrimento psíquico, o sofrimento por falta de comida, por falta de condições adequadas. Em 2004, uma junta tripartite do município, estado e Ministério da Saúde encampam o processo de fechamento, que eles chamaram de processo de intervenção, da Casa de Saúde Dr. Eiras com então 952 pacientes internados naquela época. E o processo se conclui oito anos depois, em 23 de março de 2012, com o fechamento da Dr. Eiras, e eu estava lá participando ativamente desse dia festivo”, contou ele.
Felício discorreu ainda sobre a Política Nacional de Saúde Mental e as políticas que se seguiram na área, sobre as chamadas residências terapêuticas, destacando que “a rede substitutiva é ampla”. Ele tem onze anos de experiência em Saúde Mental em Paracambi, tendo coordenado o Centro de Atenção Psicossocial Álcool Outras Drogas (CAPSAD) da região por oito anos, cargo que deixou para atuar no Hospital Paracambi (conhecido como Hospital da Cascata).
Homenagens
Ao longo do evento, Vanda Vasconcelos prestou homenagens as pessoas e instituições com as quais a Subsede Baixada firmou parcerias nos últimos anos e professores das Universidades dos cursos de Psicologia.
Foram homenageados o presidente da Cruz Vermelha de Nova Iguaçu, Daniel Coelho, o presidente do Sindicato dos Psicólogos do Rio de Janeiro, Marinaldo Silva Santos, a coordenadora do Centro de Direitos Humanos da Diocese de Nova Iguaçu, Irmã Yolanda Florentino, as professoras Carla Maria Mendes, da SEFLU e UNIABEU, Maria Luísa Rodrigues Sant’Ana, da UNIABEU, Ana Claudia de Azevedo Peixoto da UFRRJ/Seropédica, e Ana Maria Marque Santos, da UFRRJ/Nova Iguaçu. Além deles, foi homenageado também o funcionário administrativo da Subsede do CRP-RJ na Baixada Luiz Cláudio da Silva Machado.