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“É preciso realizar Mostras de Práticas em Psicologia para conhecermos novas experiências”, diz Ana Bock em conferência de encerramento da 10ª Mostra


Data de Publicação: 12 de agosto de 2016


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A psicóloga e professora Ana Bock palestra em conferência de encerramento sobre a história da Mostra de Práticas em Psicologia

Encerrando a 10ª Mostra Regional de Psicologia e Políticas Públicas, ao final de três dias de evento na Universidade Veiga de Almeida (UVA) da Tijuca, a mesa “Mostra de Práticas em Psicologia: um marco na história da profissão” contou com a presença da psicóloga Ana Bock, que foi presidente do Conselho Federal de Psicologia (CFP) por três gestões e atualmente preside o Instituto Silvia Lane – Psicologia e Compromisso Social, além de professora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), onde coordenadora do Grupo de Pesquisa “A Dimensão Subjetiva da Desigualdade Social: suas diversas expressões”.

A palestrante falou sobre a importância do evento, desde a sua origem, para “descolonizar” a psicologia brasileira, que, como ela enfatizou no decurso de sua apresentação, “surgiu pelas mãos da burguesia brasileira, respondendo a um projeto de modernização do país” e correspondia a interesses das elites – distante das questões sociais do país.

“Quando a primeira Mostra de Práticas em Psicologia põe seu carro na rua, no ano 2000, poucos acolheram a proposta e, na data de encerramento das inscrições dos trabalhos, havia um número ínfimo de inscrições”, contou Bock. “Nós tínhamos, como Conselho Federal, nos empenhado e empenhado uma quantia significativa do dinheiro da categoria profissional, e o respeito que tínhamos por isto nos levava a uma preocupação exagerada. Como assim? Não era isso, erramos”, relembrou a psicóloga.

Ela e outras pessoas da equipe que organizou aquela primeira Mostra perguntaram para vários conhecidos por que eles não haviam escrito seus trabalhos no evento e eles responderam que seus trabalhos não estavam dentro da proposta da Mostra. “Aquela parte da categoria que inventou a profissão, que foi para a prática, que foi atender aquela população que nunca tinha chegado perto da psicologia, no sentido de atendimento às suas necessidades, achava que não tinha trabalhos em psicologia. Este foi o maior problema que nós enfrentamos”, contou Bock.

“Com o desenvolvimento quase clandestino de uma nova psicologia que convivia com a psicologia tradicional e conservadora, com a força do pensamento colonizado, havia uma ideia forte nascendo e se desenvolvendo subterraneamente de que aquelas práticas diferentes que se faziam da psicologia não eram psicologia”, explicou.

A propaganda do evento foi então modificada, o prazo para inscrição de trabalhos foi estendido e a proposta foi colocada de forma mais clara, com algo do tipo: “se você faz um trabalho e utiliza recursos da psicologia, inscreva seu trabalho, venha mostrar que ele é um trabalho em psicologia”, lembrou a palestrante. “Os psicólogos que faziam esses trabalhos se sentiram desafiados e inscreveram seus trabalhos. Assim, foram mais de mil trabalhos inscritos, com mais de três mil pessoas envolvidas na autoria dos trabalhos, e cerca de dez mil pessoas frequentaram a Mostra em dois ou três dias”, disse.

Não eram pessoas vinculadas à academia: eram psicólogos que trabalhavam em aldeias indígenas, nas ruas, em sindicatos, em movimentos sociais, que dialogavam com jovens, mulheres e idosos a partir de rádios comunitárias, segundo Bock. “Havia trabalhos com sexualidade, na escola e fora dela, com trabalhadores a partir de sindicatos sobre a saúde do trabalho; mulheres vítimas de violência, violência doméstica; comunidades que tinham dificuldades em dialogar e resolver seus problemas”, contou.

“Eram muitos os temas, os campos, os locais, os sujeitos, as técnicas, as informações teóricas, muito do tradicional havia sido reciclado e revisto. Novas teorias, novas formas de trabalho, novas finalidades, um novo compromisso com a sociedade brasileira: estava criada uma nova profissão, em outubro de 2000, foi inaugurada uma nova profissão nesse país”, definiu a palestrante. “Estava dado um sinal de alerta e a autorização para que muitas práticas, informadas por teorias da psicologia, pudessem fazer parte do campo da psicologia. Deixávamos de ser um pinguinho de gente da elite, para ser um conjunto de 250 mil profissionais”, prosseguiu.

Para ela, o que houve naquele momento é muito significativo na história da psicologia brasileira, inclusive porque havia muitos profissionais que só mantinham suas inscrições nos conselhos porque era obrigatório, mas que não tinham certeza sobre se atuavam realmente na psicologia. “A mostra de práticas em psicologia arrombou essa fronteira e incluiu 200 mil profissionais que estavam considerados fora do campo”, reiterou.

Ao final de sua apresentação, Bock afirmou que ainda há muitos desafios e que isso torna a realização da Mostra ainda mais fundamental para a categoria. “Para institucionalizarmos e efetivarmos essa nova psicologia, é preciso abandonar o pensamento colonizado. É preciso dialogar com a psicologia da América Latina, onde há histórias parecidas, pessoas com origens e sofrimentos parecidos”, defendeu.

Bock falou ainda sobre a importância do diálogo entre as produções latino-americanas na área. “É preciso reconhecer e buscar mais o diálogo com as nossas produções. É preciso fazer a crítica epistemológica da psicologia, superando as visões dicotômicas e ahistóricas, para termos teorias, várias, que sejam históricas e dialéticas. Esses avanços precisam ser conquistados para que não tenhamos retrocessos. É preciso trabalhar todo dia criticamente, buscar o desenvolvimento do pensamento crítico, para que essas questões possam se consolidar”, enfatizou.

“É preciso realizar Mostras de Práticas em Psicologia para que a todo momento nós possamos conhecer novas experiências e, como a mostra é feita pelo CRP, isso significa reconhecimento de que aquilo é psicologia, o que amplia a nossa profissão e a nossa categoria profissional”, completou, antes de encerrar parabenizando o CRP-RJ pela realização da 10ª edição do evento, o que chamou de “um avanço para a psicologia brasileira”.



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