Campos dos Goytacazes foi palco do 3º Pré-Congresso Regional de Psicologia promovido pelo CRP-RJ na Região Norte-Noroeste Fluminense. Reunindo psicólogas (os) e estudantes de Psicologia, o evento aconteceu no dia 22 de março no auditório da Universidade Estácio de Sá de Campos.
O evento contou com a presença das integrantes da Comissão Gestora do CRP-RJ no Norte-Noroeste Fluminense Fátima Siqueira Pessanha (CRP 05/9138), Denise da Silva Gomes (CRP 05/41189) e Evelyn Rebouças de Gouvêa (CRP 05/41205).
Antes da instalação do Pré-Congresso, teve início uma mesa de debates com temática “Psicologia Clínica, Laicidade e Direitos Humanos”.
Os palestrantes da mesa foram José Henrique Lobato Viana (CRP 05/18767), conselheiro-coordenador do Eixo Psicologia e Laicidade da Comissão de Direitos Humanos do CRP-RJ, Abrahão de Oliveira Santos (CRP 05/39267), psicólogo e professor de Psicologia Social da UFF, e Cristiana de Assis Serra (CRP 05/34086), psicóloga clínica e pesquisadora em Psicologia, Gênero e Religião.
José Henrique iniciou sua fala ressaltando que a Declaração Universal de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU) aponta a importância do respeito às liberdades de religião e crença como um de seus princípios fundamentais. Em seguida, destacou que o Código de Ética Profissional da Psicologia veda a (o) psicóloga (o) de quaisquer práticas que afirmem intolerância, negligência, opressão e/ou desrespeito de natureza religiosa.
O conselheiro do CRP-RJ afirmou a importância de se ampliar, junto à categoria, o debate sobre a importância da laicidade nas práticas psicológicas. “Falar de religião é falar de política. E quando silenciamos ou negligenciamos essa temática, vemos sendo produzidas práticas extremamente antiéticas dentro da Psicologia”.
Cristiana, por sua vez, historicizou os conceitos de gênero, religião e laicidade dentro do pensamento moderno e como eles se relacionam com a prática da Psicologia. “Os valores que nos orientam não são absolutos. Eles vieram de algum lugar e é muito importante saber de onde eles veem. É na transição entre os séculos XVI e XIX que se consolida, por exemplo, a ideia do nosso corpo como máquina e, a partir daí, vai se dando a separação do sujeito e objeto e, com isso, começamos a pensar o mundo a partir de uma interioridade e de algo que é exterior a nós. A Psicologia só pode surgir nesse contexto em que presumimos que os sujeitos são constituídos de uma interioridade, uma psique”.
Segundo ela, “foi nesse contexto que começamos a pensar nessa questão de corpo e de gênero. E, a partir daí, da obsessão médica em definir os gêneros e estabelecer lugares para eles que aparecem psicopatologias centradas na sexualidade, a qual vai servir de parâmetro para definir a identidade da pessoa. A modernidade vai organizar o mundo a partir de dicotomias: ‘homem x mulher’ e ‘razão x religião’”.
“O próprio conceito de religião surge no século XVIII durante o movimento iluminista que a desqualifica como superstição, como algo ligado ao campo da crença apenas”, acrescenta a psicóloga. “Esse é um projeto político de valorizar a ciência como uma maneira superior de interpretar o mundo. Nessa época, havia a ideia de que a religião iria se desenvolver a tal ponto que anularia e extinguiria a religião”.
“Acho muito ingênua a estratégia política de se contrapor à tentativa do projeto de se agregar valores religiosos na prática da Psicologia alegando que a Psicologia é científica. Se usamos apenas a estratégia da definição, nos colocamos numa posição muito frágil porque as definições não são absolutas, elas podem ser mudadas. Para a prática clínica, precisamos adotar uma ética da alteridade em que passamos a olhar o outro como um outro, efetivamente, saindo do lugar confortável do alguém que sabe algo sobre esse outro e nos colocando no lugar desconfortável de não saber”, finalizou.
Abrahão iniciou sua fala destacando a problemática da religião, especialmente as de matriz africana, dentro da prática clínica. “A Psicologia é a profissão do cuidado com o corpo e com a alma. É a partir disso, dessa análise de implicação, que gostaria de falar para vocês”.
Ele também provocou algumas reflexões: “No consultório, como a questão da religião é colocada? E as religiões de matriz africana: como elas aparecem? Essas religiões são acolhidas? Há escuta qualificada para isso?”
“Uma pessoa que conheço, candomblecista, chegou para sua psicóloga, em determinado momento, e disse: ‘Eu converso com Exu. Conversei ontem com Tranca Rua e Dona Sete [entidades do candomblé] está sempre falando comigo, me dizendo como devo fazer tal coisa’. Essa psicóloga ficou confusa e, sem saber o que fazer, pediu que ela tratasse desse assunto em outro espaço, pois esse era um problema religioso”, exemplificou.
“Não vou dizer que essa psicóloga estava errada”, defendeu Abrahão. “Mas essa é uma situação muito difícil, pois a experiência religiosa dessa mulher era algo extremamente delicado e confuso e não é todo o psicólogo que está preparado para lidar com uma situação dessas. E isso me diz que todos nós, psicólogos, precisamos estudar mais esse assunto”.
Pré-Congresso
O Pré-Congresso teve início após o debate com a eleição da mesa diretora para conduzir os trabalhos. Em seguida, houve a leitura e aprovação do Regimento Interno do evento.
Foi, então, feita a eleição de delegadas (os) para o Congresso Regional de Psicologia (COREP), que acontecerá entre 29 de abril e 1º de maio no Rio de Janeiro. Foram eleitas (os) cinco delegadas (os), além de dois suplentes e mais dois delegados estudantes (um efetivo e outro suplente).
Ao final, as (os) participantes foram divididas (os) em dois grupos de trabalho para debaterem e elaborarem propostas. Ao todo, foram elaboradas e votadas nove propostas, seis delas aprovadas com modificações e as outras três aprovadas na íntegra.
Março de 2016