Com auditório lotado, iniciou a primeira mesa de debates da tarde do dia 11 de novembro do X Seminário Regional de Psicologia e Direitos Humanos e IV Seminário Regional de Psicologia e Políticas Públicas.
“Quem avalia o avaliador: a profecia autorrealizável dos testes” foi o tema do debate, que teve a presença dos palestrantes Pedro Paulo Gastalho Bicalho (CRP 05/26077), psicólogo, professor do Instituto de Psicologia da UFRJ e ex-coordenador da Comissão Nacional de Direitos Humanos do Conselho Federal de Psicologia; Silvia Ignez Ramos (CRP 05/28424), doutora em Psicologia, psicóloga do CDEDICA – Defensoria Pública Geral do Estado do Rio de Janeiro e professora de Psicologia Jurídica em graduação e pós-graduação, e José Novaes (CRP 05/980), professor aposentado da UFF e conselheiro-presidente do CRP-RJ.
Esta mesa teve a mediação de Maria Márcia Badaró Bandeira (CRP 05/2027), psicóloga, colaboradora do CRP-RJ e psicóloga aposentada da SEAP.
O conselheiro-presidente do CRP-RJ, José Novaes, foi o primeiro a falar, refletindo sobre a questão proposta no título da mesa “quem avalia o avaliador. “Esse título me remete à frase original ‘quem educa o educador’ que faz parte de um texto marxista. Isso está dentro de um contexto no qual temos que estar em constante debate sobre como melhorar e validar nossos métodos e instrumentos. E quais são os profissionais que estão avaliando e orientando os outros profissionais.”
Depois, trazendo uma breve contextualização histórica dos testes psicológicos, Novaes pontuou: “A Avaliação Psicológica remonta aos primórdios da Psicologia no século XIX. Posteriormente, a partir da década de 1960, os testes se tornaram um dos principais instrumentos da Avaliação Psicológica”.
O presidente do CRP-RJ problematizou também o caráter científico desses testes. “A constituição científica dos testes não lhe conferem uma validade por si só. Os critérios psicométricos não devem ser os únicos para se realizar uma avaliação psicológica. A avaliação psicológica não é uma especialidade em si, já que todas as áreas da Psicologia fazem avaliação. Até já houve uma proposta no sistema Conselho de tornar a Avaliação uma especialidade, mas não foi adiante”, explicou Novaes, demonstrando que por, seu caráter de instrumento nas mais diversas áreas da Psicologia, a Avaliação Psicológica não poderia se tornar ela própria uma área desta ciência.
Pedro Paulo trouxe uma reflexão acerca da suposta neutralidade da Avaliação Psicológica. “O desafio da Avaliação Psicológica talvez seja mais complexo do que imaginamos. Nosso primeiro desafio é reconhecer que ela não é tão neutra quanto se pretende. E, na verdade, temos que abrir mão desse estatuto de neutralidade para poder pensar na avaliação como um instrumento que produz efeito. Inclusive, efeito violador de direitos”.
“A Avaliação Psicológica, como prática neutra, retira-se do lugar de implicação. Ou seja, avaliar a avaliação somente do ponto de vista da validade dos testes não resolve nosso problema porque continua se considerando neutro a priori. E é esse o grande impasse. Temos que reconhecer a implicação e a produção de efeito de todas as nossas ações, entre elas a Avaliação Psicológica”, argumentou Pedro Paulo.
Já Silvia Ignez destacou que “a profecia autorrealizável é como a força de uma crença que influencia o comportamento das pessoas a alcançar determinado prognóstico”. Após a exibição de um documentário de sua autoria “Houve?”, a professora seguiu sua fala trazendo uma reflexão sobre o método utilizado no Sistema Judiciário para obter o depoimento de crianças em casos de abuso.
“Temos que estimular o debate a respeito do método que se usa no chamado Depoimento sem Dano, quando as crianças que supostamente sofreram abuso são colocadas em uma sala à parte com um profissional que está instruído para colher depoimento. Essa sala é toda filmada e as imagens são analisadas pelo juiz, advogados, promotor e todos os envolvidos no caso”, criticou ela.
Silvia explicou também que com esse método de Depoimento Sem Dano, o número de condenações a supostos abusadores aumentou. Porém, há controvérsia sobre como o método afeta as crianças que participam dele, pois elas acabam relembrando momentos traumáticos, sofrendo uma revitimização e sendo as responsáveis pela condenação de, muitas vezes, pessoas próximas a ela. “Ou seja, o Depoimento sem Dano talvez não seja tão sem danos assim. Será que as crianças não tem direito ao silêncio?”, concluiu.
Por fim, a mediadora da mesa, Márcia Badaró, trouxe uma breve ponderação sobre outra modalidade de Avaliação Psicológica, o Exame Criminológico. “Esse tipo de teste, que é uma realidade, não foi uma coisa criada pela Psicologia, mas sim cunhado por psiquiatras e operadores do Sistema Judiciário. Ainda assim eu me pergunto: como definir periculosidade?”.
Dezembro de 2015