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46º Cine Psi Baixada sobre Psicologia e Relações Raciais acontece em Nova Iguaçu


Data de Publicação: 3 de maio de 2015


“Psicologia e Relações Raciais” foi o tema do 46º Cine Psi Baixada, que aconteceu no dia 28 de abril na Subsede do CRP-RJ em Nova Iguaçu com participação de profissionais e estudantes de Psicologia e de áreas afins.

Iniciando o evento, foram exibidos dois vídeos para instigar o debate. O primeiro foi um trecho de uma gravação do Programa “3 a 1” da TV Brasil, que discutiu o tema “Racismo Enraizado na Sociedade Brasileira” a partir da fala de três especialistas para debater as raízes do preconceito e a situação do negro no Brasil hoje.

O segundo vídeo foi o filme “Xadrez das Cores” (2004), dirigido por Marco Schiavon, que narra a história de uma senhora branca que fica sob a guarda de uma empregada doméstica negra. A idosa não disfarça seu racismo e utiliza o jogo de xadrez para humilhar a empregada, mas é justamente o jogo de xadrez que fará com que as personagens produzam reflexões que mudarão suas vidas.

Ao término dos vídeos, Jacqueline dos Santos Soares (CRP 05/41408), integrante da Comissão Gestora da Subsede Baixada e representante do CRP-RJ no Fórum Municipal dos Direitos da Criança e Adolescente de Duque de Caxias, chamou os debatedores para compor a mesa. Participaram Andris Cardoso Tibúrcio (CRP 05/17427), psicóloga, conselheira-presidente da Comissão de Saúde do CRP-RJ e integrante da Comissão dos Direitos Humanos do CRP-RJ, e Otair Fernandes de Oliveira, doutor em Ciências Sociais, professor na UFRRJ e coordenador do Laboratório de Estudos Afro-Brasileiros da UFRRJ – campus Nova Iguaçu.

Iniciando o debate, Otair pediu que os participantes compartilhassem suas impressões e reflexões sobre os vídeos. Uma psicóloga comentou que a primeira coisa a que os vídeos remeteram foi à questão do racismo muito associado ainda à divisão entre classes sociais. Uma estudante lembrou como o racismo é uma problemática atual, em que, embora muitos avanços tenham sido obtidos nos últimos anos, muito ainda resta para ser conquistado na erradicação desse mal que assola nossa sociedade.

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Outra participante lembrou a questão da violência policial e institucional que massacra a população negra em várias esferas. Em seguida, Andris falou sobre a presença do racismo nos serviços de Saúde, onde atua. “É importante entender esse lugar do qual eu falo. E esse lugar não é fácil. Eu sou negra e atuo em serviços de Saúde. Quem está dentro desses serviços vê a diferença de acessos entre a população branca e a população negra”.

“Como profissionais de Psicologia”, acrescentou, “temos um incômodo da indiferença porque percebemos que a população negra ocupa um lugar de invisibilidade em nossa sociedade, principalmente em relação às políticas públicas, que não chegam a essa população. Por isso, pensar a questão da autoestima dos negros, uma população que historicamente tem seus direitos negados, é muito difícil”.

Jacqueline fez uma breve comentário, lembrando que as (os) psicólogas (os), independente de seus espaço de atuação, não podem “promover uma intervenção sem fazer esse recorte racial e histórico”.

Otair, por sua vez, enfatizou que “ninguém nasce racista; nós nos tornamos racistas no processo de socialização, no contato com nossos pares”. Ele destacou também que “Entender o processo sócio-histórico de construção do nosso país é fundamental para compreendermos como o racismo se propaga. A sociedade brasileira é altamente estratificada, desigual e racista e nós somos frutos desse processo”.

“É preciso entender também o que é ser negro nesse país, e essa identidade está altamente ligada a diversos processos de negação e silenciamento. Por isso, digo que a luta contra o racismo é também uma luta contra a ignorância”, finalizou.

Entrevista com Otair Fernandes de Oliveira

Durante o evento, o professor Otair concedeu ao CRP-RJ uma entrevista exclusiva em que falou um pouco mais sobre a situação do negro no Brasil e também sobre o LeAfro, Laboratório de Estudos Afro-Brasileiros e Indígenas da UFRRJ, que coordena.

Veja abaixo os principais trechos da entrevista:

Fale um pouco sobre sua militância e seu trabalho com a Comunidade Negra na Baixada.

Otair: Já fui do Movimento Negro durante a década de 1980 integrando diretamente o movimento com a participação popular para a Constituinte. Hoje, me considero um ativista intelectual, pois, como sou professor universitário, a minha militância está muito focada em nível da universidade através do LeAfro, que é um laboratório com pesquisadores negros e não-negros e tem como objeto de estudo essa questão da problemática ético-racial nas diferentes áreas de conhecimento. Pelo LeAfro, trabalhamos com a divulgação e disseminação de informações que visam a combater o racismo em suas diferentes dimensões e pautar a questão da educação nas relações étnico-raciais na formação principalmente dos professores sob a perspectiva da Lei 10.639, complementada com a Lei nº 11.245, que colocam a obrigatoriedade do ensino da história da África e da cultura afro-brasileira e indígena.

O LeAfro possui uma sede física?

Otair: O Laboratório funciona na sala dos professores do campus de Nova Iguaçu da UFRRJ, que é um campus novo, criado em 2005. Mas, agora, está sendo projetado um prédio para os cursos de pós-graduação e o LeAfro vai ter uma sala nesse prédio. Até porque nós também temos um curso de pós-graduação e atualmente estamos na terceira versão do curso da UniAfro, que é Política de Promoção de Igualdade Racial na Escola e cujo público-alvo são os professores da rede pública da Baixada Fluminense.

Qual a ação mais emblemática do LeAfro que o senhor queira destacar?

Otair: A partir da Lei nº 12.711, conhecida como Lei das Cotas, estamos, em conjunto com outros grupos do Movimento Negro, organizando uma comissão mista para levantar dados e acompanhar os alunos cotistas da UFRRJ de modo que tenham direito não apenas ao acesso à universidade como também à permanência nela. Outro trabalho importante que desenvolvemos são as Jornadas LeAfro, uma articulação entre diferentes grupos e movimentos da Baixada pautando a questão da afro-brasilidade em eventos e encontros. Trabalhamos ainda nas publicações que mantemos com os nossos alunos da pós-graduação visando à produção e disseminação de conhecimento sobre as diversas questões relacionadas à afro-brasilidade e às relações raciais.

Estamos agora também atuando em parceria com os terreiros da região da Baixada. Não sei se muitos têm conhecimento disto, mas a Baixada é a região brasileira com maior número de terreiros, superando a Bahia. Agora no dia 30 de maio, que é o Dia da Baixada, vamos levar a universidade a um importante terreiro aqui de Nova Iguaçu, desenvolvendo uma atividade social e cultural em relação à pratica da religiosidade afro-brasileira, pois o terreiro não é só um espaço da religiosidade, mas de resistência e luta da cultura de raiz africana. E, para nós, isso é muito significativo porque um dos problemas do racismo é justamente a ignorância.

Então, através do processo de colonização, o que conhecemos sobre o negro no Brasil? O que conhecemos sobre a África? O que conhecemos sobre os indígenas? Nós conhecemos aquilo construído através da visão do colonizador, a partir da visão eurocêntrica. Desmistificar essa visão é trazer à tona a história dessas culturas e desses grandes personagens que povoam a Baixada Fluminense.

Maio de 2015



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