A primeira atividade da parte da tarde foi a mesa de debates “Articulação em rede de serviços: estratégias e desafios”, coordenada por Helena Rego Monteiro (CRP 05/24180), conselheira-presidente da Comissão de Psicologia e Educação do CRP-RJ e membro do Fórum sobre Medicalização da Educação e da Sociedade.
Os palestrantes dessa mesa foram Aline Lage, professora de Psicologia no Instituto Nacional de Educação de Surdos, mestre em Ciência Ambiental e doutora em Educação, Nira Kaufman e Sossa (CRP 05/41931), psicóloga e colaboradora da Comissão de Psicologia e Educação do CRP-RJ, e Rui Harayama, cientista social, mestre em Antropologia da Ciência e Tecnologia, membro da secretaria-executiva do Fórum sobre Medicalização da Educação e da Sociedade e colaborador das Comissões de Direitos Humanos e Educação do CRP-RJ.
Helena abriu a mesa destacando que muitas vezes não nos damos conta de como “a nossa vida fica capturada pela lógica da medicalização que nos aprisiona. E a mídia entra como coadjuvante nessa lógica de captura, nessa lógica capitalista de produção de transtornos, de tratamentos e de fármacos”.
A temática da fala de Nira foi “Estratégias de inclusão e mediador escolar: quem é esse personagem e para que ele serve?”, abordando o papel do mediador como a principal estratégia de inclusão em algumas instituições privadas de ensino na cidade do Rio. “A ideia é que o mediador faça tudo com esse aluno no que diz respeito ao cotidiano da sala de aula e da escola. Assim, o mediador se torna responsável pelo desenvolvimento desse aluno e, mais uma vez, a escola se isenta desse desafio e dessa responsabilidade de lidar com o aluno”, criticou.
Desde que iniciou sua atuação como mediadora, Nira se questionava sobre o papel desse profissional na escola. “O que aquele adulto, além do professor, está fazendo na sala de aula? Ele vai incluir o aluno, mas que inclusão é essa se esse profissional está ali marcando a diferença? É preciso pensar outras práticas de inclusão para aquele aluno. Nosso objetivo é torna-lo mais autônomo e não reforçar a diferença”.
Aline, por sua vez, provocou a reflexão sobre o debate da medicalização a partir das políticas públicas voltadas para a população surda e tratou também dos diversos discursos sociais produzidos em torno da pessoa surda. Desde os tempos da Grécia antiga, o corpo do surdo é altamente medicalizado e o diagnóstico permaneceu por muitos séculos como o de não-humano.
Por volta do final do século XIX, os especialistas mundiais se reúnem para discutir uma possível forma de educação para a população surda e, segundo a literatura, foi nesse momento em que foi traçada a língua de sinais. “Nessa época, havia a compreensão de que, para o surdo se tornar um humano de verdade, ele tinha que aprender a falar”, explicou Aline.
Rui abordou a interface entre o mercado farmacêutico e a pesquisa científica a partir de uma série de arranjos e atores que vão se ligando e se associando para viabilizar a produção de um conhecimento científico que vai dar sustentação ao fenômeno da medicalização.
“A presença da indústria farmacêutica vai interferir no modo como pesquisamos, ensinamos e aprendemos aquilo que é considerado normal e patológico”, acrescentou o antropólogo. Comentou que, ainda, sobre o fenômeno que denominou “viralização do pensamento”, que acontece a partir das mídias sociais onde o conhecimento se propaga de modo rápido e instantâneo pelo mundo.
Além disso, ele alertou para a importância de todos estarmos aptos a avaliar a pertinência de todo esse conhecimento que circula pela rede. “Muito do conhecimento que se vê hoje em dia como científico, na verdade, é um modelo que se apropriou da forma de circulação das informações nas redes sociais”, criticando o que chamou de “sistema produtivista de conhecimento, que é simplificista e que, cada vez mais, se pauta em meta-análises para conseguir transformar a repetição dessa produção de conhecimento em verdades, naturezas e realidades que não necessariamente são aquelas que encontramos quando vamos fazer uma pesquisa de campo”.
Março de 2015