“Dialogando com a Comissão de Orientação e Fiscalização (COF)” foi o tema de mais um “Dialogando com o CRP-RJ”, que, em sua 7ª edição, reuniu profissionais e estudantes, no dia 4 de dezembro, na sede do Conselho, para debater, junto à Comissão Gestora e aos psicólogos fiscais da COF, temáticas diversas relacionadas à prática cotidiana da Psicologia.
O evento teve início com uma dinâmica diferenciada e instigante: para provocar o debate e a reflexão entre os participantes, foram encenadas quatro cenas distintas que retratam situações emblemáticas vivenciadas pela (o) psicóloga (o) em sua atuação. As cenas encenadas tinham como temáticas: (1) Saúde Suplementar, (2) Produção de documentos pela (o) psicóloga (o), (3) Práticas Alternativas/Complementares/Integrativas, e (4) Remuneração e carga horária.
Dentro da temática da Saúde Suplementar, um psicólogo participante abordou a questão da hierarquização dos saberes dentro da área da Saúde a partir da centralização na figura do médico, já que a ANS determina que haja um encaminhamento médico prévio para os serviços psicológicos.
“É interessante pensarmos como que, para você, usuário da rede privada de saúde, ter direito ao atendimento psicológico, é preciso uma chancela do médico. Essa situação nos coloca a questão da autonomia profissional”, destacou outro psicólogo participante.
“Além disso”, complementou uma psicóloga participante, “com essa necessidade de encaminhamento médico, muitas vezes o paciente já chega em nosso consultório com um rótulo. E isso dificulta o próprio processo terapêutico, pois, em muitos casos, o diagnóstico previamente dado pelo médico não corresponde àquilo que percebemos ao longo desse processo e, muitas vezes, é difícil para o próprio paciente se desvincular dessa rotulação”.
“A questão da Saúde Suplementar configura o Ato Médico na prática. Desde 2004, o Sistema Conselhos de Psicologia vem travando uma luta contra esse projeto de lei e, embora ele não tenha sido aprovado em Brasília, essa luta não terminou porque o fantasma do Ato Médico ainda paira sobre nós”, ponderou um psicólogo participante.
Outro tema debatido foi a aplicação de testes psicológicos. Uma psicóloga participante que atua com avaliação psicológica para obtenção da Carteira Nacional de Trânsito (CNH) criticou o uso indiscriminado de testes na Psicologia. “Será que a aplicação de testes é a única forma de avaliação psicológica possível? Além disso, devemos nos questionar a que serve essa avaliação, afinal?”.
“Há muitos anos”, interveio um psicólogo participante, “que eu escuto o seguinte mantra: ‘a avaliação psicológica não se resume à aplicação de testes’. Infelizmente, esse mantra não produz resultado algum e ainda não se concretizou na prática. Eu considero que limitar a avaliação psicológica ao uso estreito e padronizado do teste psicológico não pode ser absolutamente defendido”.
O próximo tema discutido foi o uso de Práticas Alternativas na Psicologia. Alguns participantes questionaram a validação dessas práticas dentro da Psicologia e se era permitido empregá-las como psicóloga (o).
Conforme orientação dada por uma psicóloga da COF, o debate sobre o uso das Práticas Alternativas, depois chamadas Complementares e hoje intituladas Integrativas, foi evoluindo na área da Saúde e hoje algumas profissões já reconhecem algumas dessas práticas. No caso específico da Psicologia, o Conselho Federal de Psicologia instituiu as resoluções nº 10 e 11, em 1997, em que estabelece os critérios de divulgação, pesquisa e estudos acadêmicos para o tema.
“O problema é que essas práticas não são específicas de nenhuma profissão, por isso qualquer pessoa pode criar um curso de formação nesse campo. Em algumas profissões, há pesquisas sendo desenvolvidas no sentido de comprovar a validação científica dessas técnicas terapêuticas. No caso específico da Psicologia, não temos, atualmente, nenhuma comprovação de caráter científico de que elas se tratem de uma prática psicológica eficaz”, orientou a psicóloga da COF.
Em seguida, debateu-se o atendimento psicológico on-line, uma das discussões que tem gerando grande polêmica em nosso país. Um psicólogo participante explicou que há normativas do CFP a respeito dessa prática, a última delas datando de 2012 (Resolução CFP nº 11/2012). Conforme ressaltou, a resolução do CFP faz uma distinção entre processo terapêutico e o aconselhamento terapêutico, estabelecendo um limite máximo de sessões mediadas por computador para cada caso. Ele comentou, ainda, sobre os riscos dessa prática, especialmente no que se refere à questão do sigilo e a salvaguarda dessa troca de informações entre o terapeuta e o paciente.
Por fim, foi abordado o tema da laicidade na Psicologia e a forma como a (o) psicóloga (o) deve proceder em respeito aos parâmetros éticos da profissão. Alguns participantes narraram experiências que tiveram de pacientes que chegavam ao consultório demandando ao psicólogo apoio e acompanhamento espiritual.
“Quanto a essa questão da Psicologia e Religião, cabe ao psicólogo acolher, escutar e respeitar a crença religiosa do seu paciente. O psicólogo, no espaço clínico ou em qualquer outro espaço de acolhimento, não pode induzir, sob qualquer hipótese, convicções religiosas em seus pacientes”, defendeu um psicólogo participante.
“Essa discussão nos remete à grande questão política da laicidade na Psicologia e também no Estado brasileiro. Laicidade não significa ser contra as religiões. Pelo contrário, é a partir da laicidade que o respeito à crença e à prática de todas as religiões é garantido”, finalizou outro psicólogo participante.
Ao final do evento, foram distribuídas algumas publicações recentes do CRP-RJ, tais como os Cadernos do II, III e V Prêmios Margarete de Paiva Simões Ferreira, o livro “Fragmentos de discursos (não tão amorosos) sobre o Exame Criminológico: um livro falado” e “Ética e Psicologia: Reflexões do CRP-RJ”. Todas essas publicações estão disponíveis para download gratuito em nosso site no link: http://www.crprj.org.br/publicacoes/livros/.