“Violência e Terrorismo de Estado ontem e hoje: Linhas de Fuga” foi o tema da terceira mesa de debates do III Seminário Regional de Psicologia e Políticas Públicas e IX Seminário Regional de Psicologia e Direitos Humanos, ocorrida na quinta-feira, dia 13 de novembro.
Com mediação da conselheira-presidente da Comissão Regional de Direitos Humanos (CRDH) do CRP-RJ, Janne Calhau Mourão (CRP 05/1608), a mesa contou com a participação de Eduardo Losicer, psicanalista e analista-institucional argentino-brasileiro e membro da Equipe Clínico-Política do Rio de Janeiro e do projeto Clínica do Testemunho, Jandira Guaraci de Lucena Mendes, membro da Comissão de Pais e Familiares de Presos e Perseguidos Políticos do Rio de Janeiro, e Beatriz Affonso, cientista política e diretora do Centro pela Justiça e pelo Direito Internacional (CEJIL).
Eduardo, que foi exilado da Argentina em 1976 por se opor à ditadura militar naquele país, compartilhou com os presentes sua experiência como militante afetado pela violência de Estado. “Fui militante da Federação Argentina dos Psiquiatras numa época em que se deflagrava um dos mais violentos períodos de terrorismo de Estado no país”.
Nesse sentido, Eduardo afirmou a importância de que sejam traçadas linhas de fuga a essa violência institucional que, sob diversas maneiras, se perpetua nos dias atuais. “Para mim, linhas de fuga são um conceito útil para pensarmos formas de escaparmos do poder, principalmente do poder institucional. Linhas de fuga são estratégias importantes para mantermos a nossa autonomia de pensamento e ação”, declarou.
Em seguida, o psicanalista argentino-brasileiro falou sobre a Clínica do Testemunho, um projeto fomentado pela Comissão de Anistia e voltado à formação de núcleos de apoio e atendimento psicológico às vítimas do terror do Estado na época da ditadura civil-militar brasileira (1964-85) e seus familiares. Além do atendimento psicológico, o projeto também inclui as dimensões de capacitação de profissionais e formulação de insumos de referência (pesquisas/sugestões para ampliação de políticas públicas).
“Nós, da Clínica do Testemunho, estamos empenhados em levar adiante nosso projeto clínico-político em que o Estado assume a responsabilidade simbólica por tais atos de terrorismo e violência, com pedido de desculpas formal às vítimas e/ou a seus familiares, reparação financeira e restituição da memória e da história”, enfatizou.
“Com esse projeto”, reiterou Eduardo, “aprendemos que, sem reconhecimento, não há reparação e, sem memória da injustiça, não há justiça. E, no nosso trabalho clínico junto a essas vítimas, percebemos que nunca se sai ileso da escuta dessas falas nunca ditas”.
Jandira, por sua vez, iniciou sua fala narrando como se formou a Comissão de Pais e Familiares de Presos e Perseguidos Políticos do Rio de Janeiro. “No dia 12 de julho do ano passado, 23 jovens foram presos em suas casas e enviados para um presídio de segurança máxima. Os que não estavam em casa passaram a ser considerados foragidos. O crime que eles cometeram? Participaram das manifestações de julho de 2013 no Centro do Rio”.
Conforme enfatizou Jandira, “estes jovens estão sendo criminalizados por terem a coragem de ir às ruas denunciar os abusos cometidos contra as camadas mais pobres da população. A polícia tem agido de forma covarde para defender interesses privados e/ou do governo. Manifestar é um direito constitucional e eles estão querendo calar os nossos jovens. Vivemos uma ditadura disfarçada de democracia”.
“Outras manifestações virão e nós, da Comissão, estaremos lá para defendê-las, apoiando nossos jovens, apoiando nossos filhos porque o Estado tem de ter responsabilidade com o seu povo”, defendeu.
Beatriz abordou a atuação do Centro pela Justiça e o Direito Internacional (CEJIL) na proteção e defesa dos Direitos Humanos. O CEJIL é uma organização não-governamental de Direitos Humanos – criada em 1991 como um consórcio de organizações de DDHH da América Latina e do Caribe – que leva à Comissão e à Corte Interamericana de Direitos Humanos casos de violações desses direitos que ainda não obtiveram resolução judicial nos países em que os fatos sucederam.
“No CEJIL, atuamos no atendimento a pessoas vítimas de violência institucional e, a partir do trabalho que desenvolvemos, chamam atenção as formas como as arbitrariedades cometidas são formalizadas para dificultar a resolução judicial dos casos de violações de direitos. As informações são organizadas de modo a colocar a vítima como responsável pela própria morte/execução. Com isso, percebemos o mesmo modus operandi utilizado na ditadura militar para forjar provas e justificar execuções sumárias”, relatou.
Conforme analisou a diretora do CEJIL, “diante de todos esses relatos e ocorrências, me pergunto sempre a quem servem as forças de segurança afinal: como poderemos acreditar que a força policial, à qual delegamos legitimidade para atuar em prol da nossa segurança, está sendo utilizada para garantir de fato segurança se essa mesma força acaba sempre se voltando contra nós?”.
“Não podemos nos esquecer”, concluiu Beatriz, “de que não existem desenvolvimentos indivisíveis, ou seja, não há desenvolvimento econômico de fato se não houver desenvolvimento cultural, social e político”.
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