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Seminário Internacional Álcool e Outras Drogas na Atenção Básica acontece no Rio de Janeiro


Data de Publicação: 19 de novembro de 2013


Foi realizado, nos dias 7 e 8 de novembro, no Arquivo Nacional, Centro do Rio, o Seminário Internacional Álcool e Outras Drogas na Atenção Básica de Saúde, promovido pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

Quem abriu o encontro foram os professores Ângela Maria Mendes Abreu e José Mauro Braz de Lima, membros da comissão científica responsável pela organização do evento. José Mauro falou sobre a importância de se ter um espaço de troca como esse e agradeceu todos os envolvidos na organização do evento.

Logo depois, Tereza Barroso, da Escola Superior de Enfermagem de Coimbra, Portugal, deu início ao debate focando na experiência de Portugal. O tema da sua palestra foi sobre as estratégias de enfrentamento aos problemas relacionados ao álcool e outras drogas e Atenção Primária de Saúde.
De acordo com ela, na década de 1990, Portugal sofreu uma grave crise de saúde e a saída escolhida pelo governo foi a de fazer trabalho nacional de combate às drogas e a toxicodependências. Ela pontuou algumas das inovações escolhidas para tratar do tema naquele espaço, uma delas foi a descriminalização do consumo de todas as substâncias psicoativas. Ao mesmo tempo foram criadas comissões de discussões da toxicodependência por cada distrito do território nacional.

Erikson Furtado, professor da USP, afirmou estar feliz em observar os avanços nos trabalhos quem envolvem a questão. Para ele, bom senso não é o suficiente para se ter bons resultados. “Precisamos ter técnica, estudos e estrutura. Precisamos entender também que o álcool e as drogas não são um problema individual. O problema é sempre resolvido numa relação comunitária”, afirmou.

Debates na parte da tarde

A primeira atividade do evento na parte da tarde foi a conferência “Consumo de álcool na gravidez: uma questão de saúde pública”, ministrada pelo médico e professor da UFRJ José Mauro Braz de Lima.

Durante a palestra, José Mauro abordou a chamada Síndrome Alcoólica Fetal (SAF), que, segundo ele, “constitui um complexo quadro clínico de diversas manifestações decorrentes da ação do álcool sobre o organismo fetal”.

“O álcool atravessa todas as estruturas do organismo. Quando a mãe ingere álcool, é como se o feto tomasse uma injeção dessa substância na veia”, explicou. “A SAF pode repercutir na má formação cerebral, renal e cardíaca, entre outras, do feto. Os efeitos dessa patologia podem se estender até a idade adulta”.

De acordo com o médico, a situação é preocupante uma vez que “cerca de 22% das grávidas brasileiras em 2009 relataram ter feito uso de bebida alcoólica na gravidez. É importante destacar que não existe dose pequena segura: todas as doses envolvem riscos ao feto”.

Após o debate, foi dado início ao painel “Álcool e outras drogas: desafios na atenção primária”. Eduardo Alves Melo, representante do Ministério da Saúde, falou sobre “Política pública de Atenção Básica no enfrentamento do álcool, crack e outras drogas”.

“A questão do enfrentamento ao álcool e outras drogas é muito complexa, pois requer um esforço gigantesco do poder público e, muitas vezes, respostas rápidas, o que nem sempre é possível. Essa problemática envolve questões que devem ser abordadas de modo articulado na busca de um resultado que, na maior parte das vezes, é de longo prazo”, destacou.

Em seguida, Eduardo abordou alguns aspectos da Rede de Atenção Psicossocial em nosso país. Segundo ele, “a Rede é um programa abrangente do Ministério da Saúde para o enfrentamento a essa questão. Em nossa perspectiva, não é possível separar de modo rígido a Saúde Mental da questão do álcool e outras drogas. Agora, é importante destacar que a rede de cuidados não é uma rede de serviços apenas; para além disso, ela é uma rede de relações”.

Com temática “População de Rua no Rio de Janeiro: desafios e perspectivas”, a professora da Escola de Serviço Social da UFRJ Miriam Guindani tratou de uma pesquisa encomendada pelo Ministério da Justiça à UFRJ sobre as políticas de atenção a essa população em quatro capitais brasileiras, incluindo o Rio de Janeiro.

De acordo com a professora, a pesquisa é resultado “de uma pressão política do movimento nacional em prol da população em situação de rua” e vem em um momento importante em que “muitas prefeituras começam a assumir uma política de choque de ordem e limpeza urbana”.

“Os resultados da pesquisa indicam que esse grupo é extremamente heterogêneo e se constitui pelos mais diversos motivos. Por isso, uma política pública apenas não é capaz de atingir a integralidade dessa população, que demanda uma atuação em rede. E a multiplicidade dessas demandas requer uma grande qualificação por parte dos atores que atuam na rede. O grande problema é que, na maior parte dos casos, a resposta do poder público a essa complexidade é a criminalização”, explicou Miriam.

Representando a Secretaria Municipal de Saúde (SMS) do Rio de Janeiro, Leonardo Araújo de Souza abordou “Rede pública de assistência ao enfrentamento do usuário de álcool, crack e outras drogas: como estamos e para onde vamos?”.

Leonardo enfatizou que “o Plano Municipal de Atendimento a Usuários de Álcool, Crack e Outras Drogas da Prefeitura do Rio é baseado na atual política nacional e nas diretrizes da Reforma Psiquiátrica”. Ele afirmou ainda que a chamada Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) possui papel importante nessa política, pois “estabeleceu pontes de atuação dentro da rede de cuidados”.

De acordo com o representante da SMS, os eixos principais da atuação dessa rede são: a formação e educação permanente dos profissionais; a integração dos serviços disponíveis; a prática da desinstitucionalização; a geração de trabalho e renda para os usuários; a promoção de ações culturais; e a ampliação constante da rede de serviços.

“Nós trabalhamos com a perspectiva de alcançar o indicador de um CAPS para cada 100.000 habitantes. Contudo, seria desastroso implantar novas unidades sem que elas estejam devidamente articuladas e integradas à rede de serviços”, afirmou.

Por fim, a professora da Escola Superior de Enfermagem de Coimbra (Portugal) Teresa Barroso falou sobre o programa de combate ao uso de álcool em adolescentes desenvolvidos em escolas de Coimbra.

Conforme apontou, nove em cada dez adolescentes portugueses de 15 e 16 anos relatam consumo de álcool. De acordo com ela, esse dado é preocupante uma vez que “os adolescentes constituem um grupo de grande vulnerabilidade devido, entre outros fatores, à imaturidade imunológica e metabólica de seus organismos, à inexperiência no consumo do álcool e também à ausência de tolerância a essa substância”.

Teresa afirmou que, como estratégia de enfrentamento, têm sido feitas intervenções em escolas abordando “a prevenção do uso abusivo de álcool por adolescentes e familiares e também incentivando a redução da comercialização dessa substância”.

A última mesa do primeiro dia do evento foi a conferência “Atual situação de políticas públicas de governo no enfrentamento das drogas”, ministrada por Vitore Maximiano, secretário nacional de Políticas sobre Drogas do Ministério da Justiça.

“Por mais complexos que sejam os nossos desafios, não devemos nos apequenar diante deles, mas sim enfrentá-los. E é isso que nos motiva a atuar no enfrentamento à problemática do álcool, crack e outras drogas”, iniciou Vitore.

De acordo com Vitore, “o crack em especial tem se revelado um grande desafio ao poder público e é uma dos temas que estão na ordem do dia da pauta de todo o país”.

Segundo o secretário nacional de Políticas sobre Drogas do Ministério da Justiça, as recentes pesquisas do Ministério da Justiça estimam que haja em torno de 370 mil usuários de crack nas capitais brasileiras, 80% dos quais são homens, jovens, negros, pouco escolarizados e em situação de grande vulnerabilidade social.

Ainda de acordo com ele, aproximadamente 50% dos usuários de crack nas capitais brasileiras revelaram estar em situação de rua.

“Esses dados aumentam a responsabilidade da gestão pública brasileira no acolhimento e tratamento desses usuários, que, sem sombra de dúvida, vivem um sofrimento intenso e estão submetidos a toda a sorte de vulnerabilidade social”, acrescentou.

O representante do Ministério da Justiça indicou também os principais avanços e desafios da política de drogas no Brasil. “O principal avanço é a mudança de paradigma, que, desde 2006, instituiu a descriminalização do uso das drogas. Além disso, mais investimentos públicos na expansão da rede de serviços vêm acontecendo. Ainda assim, reconheço que há muito por avançar, especialmente no que diz respeito à prevenção qualificada ao consumo dessas substâncias e também ao cuidado e ao tratamento dos usuários dentro de uma rede articulada e com ampla oferta de serviços”.

 

Segundo dia

O segundo dia de evento teve início com a Conferência Internacional do médico Charles Mercier-Guyon, membro do Centre d’Études et Recherches em Medicine Du Trafic-France, que mostrou um índice comparativo de acidentes de trânsito causados pela bebida alcoólica em diversos países.

Nesse comparativo, o médico francês apresentou a situação desde a década de 70 até os dias atuais, destacando a importância da mobilização de jovens envolvidos em ações de políticas preventivas de consumo do álcool no trânsito.

“Um método que considero muito importante e eficaz é o da orientação transmitida desde a escola, para as crianças, pois nesta fase o aprendizado é diferente, e são as crianças que influenciam os pais a utilizarem o cinto de segurança e a não consumirem bebidas alcoólicas se foram dirigir, a não utilizarem o celular na direção, dentre outras ações que advertem e chamam a atenção para esse tipo de segurança”, afirmou.

Charles pontuou também os progressos alcançados até aqui através das políticas de prevenção de acidentes de trânsito. “É preciso espalhar esta ação entre os jovens. Não digo que o álcool é coisa de jovem, mas, por frequentarem casas de festas noturnas, são eles os que mais se previnem nos dias atuais.”

Após a conferência, foi ministrado o Painel de Experiências Exitosas e contou com uma mesa de debates composta pela professora e doutora DESP/EEAN/UFRJ Ângela Abreu, o Coordenador da Lei Seca /Secretaria de Governo – RJ Major Marco Andrade e a gerente de Responsabilidade Social / FETRANSPOR Márcia Vaz. O painel teve como principal abordagem a mobilização do Rio de Janeiro nas questões de trânsito.

Ângela deu início à sua fala apresentando a tabela com a distribuição de óbitos por acidentes de trânsito e suas possíveis consequências, tais como mortes e atropelamentos atrelados a um quantitativo de consumo de álcool e doses ingeridas pelos condutores de veículos.

A professora destacou também diversos projetos que são realizados dentro do “Grupo de Estudos de Alcoolemia nos Acidentes de Trânsito na Perspectiva da Lei nº 11.705/2008: Desafios e Perspectivas”, que aruá sob sua coordenação a partir de ações nas escolas, em bares e outras experiências para prevenção desses acidentes. “É necessário e fundamental enfatizar as cinco etapas de uma estratégia de Política Pública mais abrangente e efetiva: informar, educar, conscientizar, fiscalizar e penalizar”, disse.

Para o Major Marco, o evento é um espaço muito importante para discutir o impacto do trânsito na vida da população. Ele mostrou as significativas mudanças de comportamento após entrar em vigor a chamada “Lei Seca”.

“Desde o início nosso grande desafio é que o poder público pudesse efetivamente proporcionar e provocar uma mudança de comportamento e de hábitos na sociedade. Precisamos sim mudar a cultura, mas todos nós sabemos que para essa mudança é necessário um investimento em médio e longo prazo”, afirmou.

“Programa de Educação para Trânsito: Década Mundial de Segurança Viária ONU/OMS 2011-2020” foi o tema da conferência que contou com a participação do deputado federal Hugo Leal. De acordo com o deputado, a violência no trânsito é uma questão de saúde pública, visto que, no Brasil, há 43 mil mortes por ano no trânsito, um número que considera “assustador”.

Para ele, é mais que necessário discutir a educação no Trânsito. “Necessitamos procurar medidas para evitar a violência no trânsito. Fazer planos de comunicação. Temos que estimular os bons costumes, mostrar pesquisas e indicadores, além de desenvolver campanhas educativas de forma permanente”, falou.

Em seguida, começou o painel com a participação de Fernando Moreira, da Fetranspor/Abramet, que abordou “Saúde e Trânsito: perspectiva da Medicina de Trânsito”.

“A principal vítima do trânsito é o motociclista. 30% das mortes são de motociclistas. Além disso, o uso do capacete ainda é negligenciado. Outro problema é a falta de habilitação e a não frequente fiscalização pelo poder público”, disse.

O cenário da violência nas estradas federais foi revelado pela inspetora da Polícia Rodoviária Federal (PRF) Marisa Dreys, que afirmou que ainda é muito recente a visão do trânsito como um local de troca, de cidadania e de democracia. “Antes da conferência, em Genebra, o trânsito era considerado apenas como desenvolvimento, como um fator econômico”.

Ainda de acordo com Marisa, foi a partir do resultado da pesquisa da Organização Mundial da Saúde (OMS, 2004), que apontava mais de um milhão de mortes no mundo, que se começou a pensar na segurança de trânsito como um Direito Humano, afastando a ideia do trânsito como um elemento econômico apenas.

Finalizando o evento, Laura Semeraro, que é promotora pública do MPDF da Promotoria de Justiça de Delitos de Trânsito e Acidentes de Trabalho de Brasília, parabenizou o Rio de Janeiro pela aprovação de Projeto de Lei da criação do juizado especial de delitos de trânsito e falou sobre “Delitos de trânsito ou no trânsito: Crime Culposo e/ou Doloso”. De acordo com ele, “é preciso que os governantes e a sociedade enxerguem o trânsito com um olhar mais humanizado, que as pessoas se respeitem mais e pensem umas nas outras, pois só assim com práticas educacionais poderemos melhorar esses dados”.