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GTNM entrega 23ª Medalha Chico Mendes


Data de Publicação: 5 de abril de 2011


Era dia 1º de abril de 1964 quando começou a ditadura militar. Logo pela manhã, as tropas das Forças Armadas já dominavam a cidade do Rio de Janeiro e instauravam o governo que ficou marcado por censurar e torturar por mais de 20 anos. Quarenta e cinco anos e um dia depois, em 2 de abril de 2009, quando policiais militares entraram no morro da Coroa, no Catumbi, à procura de traficantes. Saíram de lá após matarem seis pessoas. Dentre elas, Josenildo dos Santos, que andava em uma das vielas da favela. Ao tentar se identificar, o lanterneiro e jardineiro voluntário na horta comunitária foi alvejado e morto sem saber o porquê.

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Criada em 1989 pela ONG Tortura Nunca Mais (GTNM), a medalha Chico Mendes de Resistência homenageia anualmente aqueles que se destacaram na luta em defesa dos direitos humanos no Brasil e no exterior. Em sua 23ª edição, que teve entrega na última sexta-feira, 2 de abril, no salão da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-RJ), homenageou, com o apoio do Conselho Regional de Psicologia do Rio de Janeiro (CRP-RJ), diversas pessoas e instituições. Entre eles, Maristela, Josilmar e Luciano, irmãos de Josenildo e que há dois anos lutam por justiça em busca dos responsáveis pela morte do irmão.

A entrega do prêmio acontece sempre perto do aniversário do Golpe militar de 1964. A ideia da organização é fazer a ligação entre o que aconteceu durante a ditadura e o que ainda ocorre em termos da violação aos direitos humanos.

“Aquele passado continua nos contagiando no presente. Ele ainda está entre nós e quem dera que nós não precisássemos estar aqui”, lamentou a psicóloga, presidente do Grupo Tortura Nunca Mais e ex-conselheira do CRP-RJ, Cecília Coimbra (CRP 05/1780). Cecília afirmou que o mundo vive um momento onde pensamentos extremistas e fundamentalistas são difundidos pelos meios de comunicação e destacou a entrega deste ano fundamental no combate a esses ideais. “É uma forma de fazer o governo nos ouvir e tomar uma atitude porque, até agora, nada”.

Para os “irmãos da Coroa”, como são conhecidos os familiares de Josenildo, receber a medalha não foi apenas um momento de fôlego e impulso para a caminhada judicial que atravessam. Neste ano, no mesmo dia da entrega do prêmio e do aniversário de dois anos da morte do irmão, a mãe, também incansável na luta da família, faleceu.

“Parece uma espécie de praga do dia 2 de abril”, lamentou Josilmar. Ao ser perguntado se dedicaria o prêmio à mãe, ele não escondeu a emoção: “Ela queria estar aqui. Ontem eu passei lá [no hospital onde ela estava internada] e ela disse: ‘você vem me buscar pra eu ir também, né?’ Esse prêmio é para ela e para o meu irmão. É por eles que nós fazemos isso tudo; é por eles que estamos aqui”.  Depois de idas e vindas ao tribunal, os irmãos aguardam nova audiência, marcada para 19 de maio.

Entre os homenageados também estava Alexandre Anderson, presidente e fundador do grupo Homens do Mar da Baía de Guanabara, criado em 2003 para auxiliar pescadores da Baía de Guanabara na luta pelos seus direitos. Acompanhado da mulher, Anderson chamava atenção por outras duas companhias: policiais armados e vestidos com coletes à prova de balas. O líder comunitário faz parte do Programa Nacional ao Defensor dos Direitos Humanos, desenvolvido pela Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República.

A escolta armada veio após dois assassinatos de lideranças do movimento. “Essa segurança está cada vez mais necessária. Ela pode não parar um possível ataque, mas nos traz mais confiança”, disse. O pescador não escondeu a felicidade com a condecoração e afirmou que “a medalha dará fôlego à luta do grupo diante das grandes empresas que atropelam comunidades e não respeitam o trabalho dos pescadores. Enquanto houver uma gota de sangue, continuaremos.”

Durante a cerimônia, foi lembrado por diversas vezes que em dezembro deste ano expira o prazo dado ao Brasil pela Corte Interamericana de Direitos Humanos para investigar e punir graves violações ocorridas durante os governos militares. Em seu discurso, o jurista Fábio Comparato, expoente na luta pelos Direitos Humanos no Brasil, se perguntou: “O que nós diremos? Diremos que entendemos e respeitamos a entidade e sua decisão, mas que ainda não conseguimos resolver nossos problemas. Isso vai aparecer nos jornais e não dará em nada”.

Ao fim de seu discurso, Comparato apresentou uma carta assinada por centenas de cidadãos e organizações nacionais e internacionais. O documento alega que “o estado brasileiro não pode se eximir de cumprir nenhuma das obrigações fixadas na sentença” e ainda que “o país, no exercício de sua soberania, aderiu voluntariamente à Convenção Americana sobre Direitos Humanos e reconheceu como obrigatória a jurisdição da Corte Interamericana de Direitos Humanos”.

A conselheira-presidente Lygia Ayres (CRP 05/1832) representou o CRP-RJ no evento, e sentou-se à mesa de autoridades ao lado do presidente da OAB-RJ, Wadih Damous, do deputado federal Chico Alencar (P-Sol/RJ), da presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB/RJ e membro do Subcomitê de Prevenção à Tortura do Alto Comissariado de Direitos Humanos da ONU Margarida Pressburger, entre outros.

A lista completa de homenageados está disponível na página do Jornal do Grupo Tortura Nunca Mais.



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