Teve início, no dia 30 de abril, no Rio de Janeiro, o segundo ciclo de 2010 do Centro de Referências Técnicas em Psicologia e Políticas Públicas (CREPOP), que mapeia e referencia a atuação de psicólogos em serviços de Assistência Social. O encontro, realizado na capital, reuniu diversos profissionais de Psicologia que atuam Centros de Referência em Assistência Social.
A psicóloga e assessora técnica do CREPOP-RJ, Beatriz Adura Martins (CRP 05/34879), iniciou o encontro explicando a função do CREPOP como dispositivo de pesquisa e mapeamento do trabalho dos psicólogos que atuam nas políticas públicas, com o objetivo de criar referências para a prática desse profissional.
A psicóloga alertou, porém, para o fato de que a referenciação das práticas não pode representar uma amarra para o psicólogo. “As referências não podem ser vistas como normas, como mais uma regra a ser seguida no cotidiano de atuação. O importante é problematizarmos a prática e avaliarmos as suas limitações”.
Ainda de acordo com Beatriz, “os ciclos são um instrumento de pesquisa permanente em todas as áreas da Psicologia. Cada ciclo é composto por dois encontros que vão gerar um relatório, o qual, após as devidas considerações dos participantes, será remetido do CREPOP Nacional”. Ela ressaltou ainda a importância de o psicólogo, além de comparecer aos encontros dos ciclos, preencher o questionário on-line, disponível no site do CREPOP Nacional.
O conselheiro e coordenador da Comissão Regional de Psicologia e Políticas Públicas do CRP-RJ, Lindomar Expedito Silva Darós (CRP 05/20112), deu as boas vindas aos participantes e explicou que a metodologia a ser seguida ao longo do evento seria a sociodramática.
Em seguida, os participantes se dividiram em duplas para, após conversar com o companheiro, apresentá-lo em primeira pessoa, em um exercício de se colocar no lugar do outro.
Os presentes, então, reuniram-se em três grupos para discutir uma situação-problema que tenham vivenciado em seus cotidianos de trabalho. O objetivo era que uma dessas situações fosse escolhida para ser dramatizada.
A história eleita foi chamada de “Caos no CRAS” e narrava a história de Maria das Dores, uma mulher grávida, com cinco filhos de pais diferentes, e casada com um usuário de drogas. Ela recorre ao CRAS (Centro de Referência em Assistência Social) para solicitar seu cadastro no programa Bolsa-Família, mas, não tendo sucesso por não preencher os requisitos necessários, procura um político para ajudá-la. Este, por sua vez, aciona a secretária de Ação Social do município e passa a pressionar a coordenadora do CRAS para que o cadastro seja efetuado. Ao final, enquanto Maria das Dores está no CRAS exigindo seu cadastro, toda a sua família é morta pelo deslizamento de terras que ocorreu no Morro do Bumba, em Niterói.
Após o fim da encenação, foi dado início ao debate, em que os participantes revelaram desconforto e angústia com relação ao papel que o psicólogo, muitas vezes, vê-se obrigado a desempenhar na Rede de Assistência. Para muitos, não há clareza sobre a atuação desse profissional dentro do CRAS – nem para quem procura o serviço nem para a própria equipe multiprofissional. Segundo os presentes, esse papel se resume, em muitos casos, ao cadastro de usuários no Bolsa-Família.
Um psicólogo, no entanto, ponderou: “A partir do momento em que o psicólogo está inserido na Assistência Social, ele está comprometido com o desenvolvimento social. Qual é o problema de o psicólogo preencher o cadastro do Bolsa-Família? Será que, enquanto cadastro um usuário no programa, não posso explorar, concomitantemente, outras questões? ”.
Na opinião de outro participante, “mesmo o CRAS não sendo um espaço essencialmente de terapia, ele é o espaço do acolhimento, de receber a pessoa da forma como ela vem e de trabalhar com ela dessa maneira”.
“Precisamos tirar nosso olhar psicologizante e patologizante sobre o usuário que nos procura no CRAS. Se, por exemplo, uma pessoa está com a auto-estima baixa, é porque outras questões que dizem respeito ao coletivo podem estar interferindo nesse sujeito”, acrescentou uma profissional presente.
Outra problemática levantada na fala de alguns psicólogos se referiu às atribuições do psicólogo e do assistente social dentro do CRAS. No entanto, segundo a avaliação de muitos participantes, não há uma separação tão rígida entre os trabalhos de ambos os profissionais dentro desse espaço. “É importante pensar como vamos operar dentro dos nossos instrumentos técnicos e éticos, já que, na prática, ambas as atuações estão muito misturadas. Não há como se pensar o CRAS como um espaço exclusivo dos assistentes sociais, pois ele é intersetorial e interdisciplinar. Se não houver Rede, não pode haver CRAS”, declarou uma psicóloga.
Nesse sentido, foi destacada a dificuldade de realizar um trabalho multiprofissional que se dê, efetivamente, a partir da interação entre psicólogos e demais profissionais dentro do CRAS. “Nosso trabalho é árduo porque é muito individualizado. É preciso buscar parcerias e articulações com outros profissionais em outros espaços”, afirmou um participante.
Uma psicóloga, entretanto, destacou aspectos positivos da atuação do profissional de Psicologia no CRAS. “Eu tenho experiências bastante positivas no CRAS, como, por exemplo, acompanhar uma pessoa que conquista sua autonomia, torna-se cidadã. . O problema é que o usuário e, muitas vezes, o próprio profissional não reconhecem a Rede de Assistência como algo que diz sobre os seus direitos”.
O próximo encontro do ciclo sobre a atuação do psicólogo nos Centros de Referência em Assistência Social ocorrerá no dia 14 de maio, na cidade de Volta Redonda. Fique atento ao site do CRP-RJ para mais informações.
Texto e fotos: Felipe Simões
7 de maio de 2010