Como mais um evento preparatório para o Congresso Nacional de Psicologia, aconteceu no dia 25 de novembro o encontro “Consciência Negra: subjetividade e racismo”. O evento foi organizado pelo Grupo de Trabalho Psicologia e Relações Raciais. Compuseram a mesa de abertura José Novaes (CRP 05/980), conselheiro-presidente do CRP-RJ, e Maria da Conceição Nascimento (CRP 05/26929), conselheira e coordenadora do GT.
José Novaes iniciou o encontro ressaltando a importância da discussão do tema como tentativa de “fugir do mito da democracia social tão presente no Brasil. O racismo não só existe, como também mexe com as subjetividades dessa população tão segredada”. Já Maria da Conceição convidou os participantes a mandarem propostas para o CNP, contribuindo assim para o avanço deste debate dentro do sistema conselhos.
Logo a seguir, a Companhia da Saúde apresentou um esquete “racismo na saúde”.
O encontro prosseguiu com as exposições do psicanalista, psicólogo e coordenador do Instituto de Psicossomática Psicanalítica Oriaperê, Marco Antônio Chagas Guimarães, e dos psicólogos e colaboradores do GT Celso Moraes Vergne (CRP 05/ 27753) e Herculano Barbosa (CRP 05/36154), que coordenou a mesa.
Celso Vergne falou sobre a democracia racial, “o dito não racista”. Segundo ele, “esse mito é um nó difícil de desatar, por um lado, e fácil de discutir, por outro. Isso se dá porque todos percebem e aceitam sua existência, mas ninguém se assume racista de verdade. O discurso é o da igualdade, mas os espaços separados continuam presentes”.
Ainda sobre isso, Celso afirmou que vivemos um racismo “à brasileira”, que incorpora o negro, mas sempre o deixando em um lugar de desigualdade. “Isso tem a ver com o contexto histórico no qual o Brasil foi formado. Como nós somos um povo miscigenado, não há como ter a dicotomia branco-negro dos Estados Unidos. A presença de ‘moreninhos’, ‘marrons-bombom’, entre outros, acaba dificultando a afirmação do indivíduo como sendo negro”.
Celso Moraes Vergne, Marco Antônio Chagas Guimarães e Herculano Barbosa, na sequência, participaram da mesa principal sobre a democracia racial.
Para Celso, a Psicologia precisa parar de fugir do tema, “como faz ao particularizar situações que são gerais”. Além disso, o psicólogo comentou que os próprios negros corroboram as desigualdades produzidas pelo sistema. “Nós pensamos: ‘por que não alisar meu cabelo se isso pode me abrir portas que poderiam estar fechadas se eu o usasse de maneira natural?’. Os negros têm passado por um processo de embranquecimento para se sentirem inseridos na sociedade”.
Já Marco Antônio falou sobre a maneira como o racismo influencia a subjetividade do indivíduo. Ele comentou que o Instituto Oriaperê tem constatado o quanto a saúde da população negra está prejudicada, assim como a do branco. “É como o Celso comentou anteriormente. Existe um paradoxo entre o que é dito e o que acontece de fato. Tais situações provocam consequências que vão desde doenças como hipertensão, aumento na mortalidade de mulheres negras grávidas, até coisas mais simples como timidez excessiva. O acúmulo circunstâncias tensas tem implicações psíquicas, já que não existe uma ‘válvula de escape’”.
No debate, Herculano chamou atenção para a influência do racismo no rendimento escolar das crianças. “Como elas não se sentem incluídas, acabam se evadindo”.
Um professor de história que estava presente vivenciou uma situação que também abrange esses dois temas. Ele trabalha em uma escola que atende parte das crianças da Mangueira. “Grande parte dos alunos são negros, mas é como se não fossem, porque não se discute a realidade deles enquanto tais”.
Sobre a associação entre educação e racismo, uma participante apontou para a necessidade de expandir a discussão para outros setores. “Não adianta a criança aprender sobre a história da cultura negra na escola e, ao chegar em casa, não conseguir debater com pais pela falta de bagagem dos mesmos. Precisamos estender isso para os sindicatos trabalhistas, universidades, entre outros”.
Outro ponto levantado foi a falta de disciplinas sobre as relações raciais na Academia. Uma aluna de Psicologia da Uerj falou sobre a dificuldade de desenvolver o tema de sua monografia – abolicionismo penal – pela falta de orientadores e textos para consultar. A conselheira Conceição comentou que também teve dificuldades quando era estudante. “Alguns psicólogos estranhavam o fato da minha especialização em relações raciais. Para eles, seria a Antropologia ou a Sociologia as áreas para tratar deste tema. Porém, a meu ver, a Psicologia precisa tomar para si esta questão, afinal o racismo tem efeitos na subjetividade”.
Marco Antonio propôs que as pessoas se articulem para “cutucar” o GT para a proposição de teses que apontem para a introdução do tema nas grades curriculares das Universidades. “O que estamos debatendo hoje pode fazer uma enorme diferença”.
A roda de conversa foi finalizada com a leitura do poema de Oliveira Silveira, um dos idealizadores do Dia da Consciência Negra.
Texto e fotos: Ana Carolina Wanderley
02 de dezembro de 2009
atualizado em 04 de dezembro de 2009