Na sexta-feira, dia 22 de setembro, foi realizado o segundo dia de eventos do I Encontro de Arte e Saúde Mental no Teatro Noel Rosa do Centro Cultural da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, organizado pelo Espaço Artaud em parceria com o Departamento de Psicologia Clínica do Instituto de Psicologia da UERJ, com apoio do CRP/05, do Departamento Cultural da UERJ e da FAPERJ.
As atividades foram abertas com a Conferência ministrada por Benilton Bezerra do Instituto de Medicina Social da UERJ e coordenada pelo Conselheiro da Comissão de Saúde do Conselho Regional de Psicologia do Rio de Janeiro (CRP/RJ), Nélio Zuccaro, que ressaltou a importância da iniciativa de eventos como este, que fazem parte do projeto político e ético da atual gestão do CRP/RJ.
Benilton Bezerra dissertou a partir dos conceitos do psicanalista inglês Winnicott sobre a criatividade e o saber viver, ambas inscritas na natureza humana. Segundo Winnicott, esta criatividade é um saber de valor primário apreendida pelo homem em sua motilidade e/ou vitalidade e agressividade, dois conceitos fundamentais, que empurram o ser humano para campos de novas experiências, que podem resultar ou não na produção artística. E é por meio destas experimentações que o homem exercita o viver criativo e alcança a saúde mental. Ao comparar um adulto com uma criança, Benilton Bezerra diferenciou-os pela capacidade inerente à criança de enxergar tudo como se fosse novo, ao contrário do adulto que, segundo o professor, “acumula certezas ao longo da vida e passa a enxergar as experiências e os acontecimentos cotidianos como uma repetição. Ele se torna incapaz de olhar essas experiências por uma outra perspectiva”.
Após a Conferência deu-se o início a primeira mesa do dia, sobre Cinema. O coordenador Ademir Pacelli Ferreira, do Instituto de Psicologia da UERJ, abriu a mesa falando sobre o uso lúdico do cinema no campo da saúde mental, que o reduz a uma válvula de escape, a uma forma de esquecer os problemas, quando o cinema pode ter um uso terapêutico. O primeiro debatedor a falar foi o crítico de cinema José Carlos Avellar que apresentou um panorama histórico do surgimento da figura do louco no cinema norte-americano e os três clichês a que ela estava vinculada e que se modificaram com as mudanças sócio-culturais. De acordo com José Carlos Avellar, o cinema criou clichês para abordar o tema da “loucura”. Para o crítico, o uso e a legitimação destes clichês se deve à falta de interesse da indústria cinematográfica em buscar explicações e levantar questionamentos. De acordo com José Carlos Avellar, dois documentários – Imagens do Inconsciente de Leon Hirszman e Estamira de Marcos Prado – rompem com esta perspectiva e possibilitam a abertura de uma série de debates deste tema com a sociedade.
Gina Ferreira, doutoranda em Psicologia Social pela Universidade de Barcelona, apresentou, após uma breve explanação sobre a história do município de Paracambi na baixada Fluminense, um vídeo produzido para divulgar e arrecadar verbas para o projeto Cinema na Praça, implementado no local. O “Cinema na Praça” surgiu com a intenção de reinventar o cotidiano, mesclar os pacientes com a população para reconstruir e mudar o olhar sobre os doentes mentais. Foi a partir deste projeto, no maior Hospital Psiquiátrico da América Latina onde Gina Ferreira está desenvolvendo este trabalho de intervenção, que se derrubou mitos e preconceitos logrando socializar e promover a interação dos pacientes com a população local.
Após o almoço, foram realizadas as apresentações das comunicações orais inscritas no evento. Os trabalhos de diferentes cidades do Brasil tiveram temas diversos, distribuídos nas seguintes sessões: Escrita e oralidade – (re)construindo narrativas; Arte e possibilidades terapêuticas; Arte e Corpo na interdisciplinaridade; e Oficina terapêutica como espaço de possibilidades. Logo em seguida aos trabalhos, os estudantes, profissionais e interessados assistiram a apresentação da peça “Ponto Cego” d’Os Nômades Companhia de Teatro Amador, que tratava de questões como a solidão e a tristeza na vida urbana.
Depois da performance, foi realizada a segunda mesa do dia, com o tema Teatro. A mesa foi coordenada pela conselheira da Comissão de Ética do CRP/RJ, Ana Lúcia Furtado, e teve participação de Eduardo Passos, professor da Faculdade de Psicologia da UFF, e de Peter Pal Pelbart, do Instituto de Filosofia da PUC/SP. Eduardo Passos falou sobre os possíveis retrocessos das conquistas da Luta Anti-manicomial por causa de discursos retrógrados contra a Reforma Psiquiátrica. Para ele, esta onda conservadora acabaria com a idéia do cuidado coletivo na saúde, com a rede multidisciplinar de saúde, recolocando velhas práticas de tratamento de pacientes na Saúde Mental: “É na experiência do caminhar, de experimentar que se constroem os objetivos, as metas”, afirmou Eduardo Passos contra o conservadorismo no tratamento na Saúde Mental, que, segundo ele, possui uma metodologia que não permite outras formas de produção, tratamento e expressão.
O segundo debatedor da mesa, Peter Pal Pelbart falou sobre suas experiências com o grupo de teatro Ueinzz, a relação da vida com a arte e como a vida invade um personagem. Segundo ele, “no palco está em cena a vida, no seu extremo, onde tangencia os estados limites. Em cena está o inaudível, o invisível e o impalpável, dando lugar a outros estados, potencias e fragilidades”.
Para a mesa de encerramento do evento estavam presentes Ademir Pacelli Ferreira, Walter Melo e Eleonôra Prestrelo, Vice-diretora do Instituto de Psicologia da UERJ, que parabenizou o evento e a iniciativa do encontro que considerou como positiva e enriquecedora.