No último dia 27 de janeiro, foi realizado na sede do CRP-RJ, o evento “Ampliando redes para a prevenção: desastres ontem e hoje na perspectiva da Psicologia e de outras áreas atuantes”. Promovido pela Comissão Especial de Psicologia em Emergências e Desastres, o encontro reuniu psicólogas, estudantes e demais profissionais especializados na atuação em desastres e emergências.
A conselheira presidenta do CRP-RJ, Céu Cavalcanti, realizou a abertura do evento desejando as boas vindas e ressaltou a atuação da Psicologia e do CRP-RJ no âmbito das emergências e desastres. “É importante de desde a psicologia a gente conseguir pensar e pautar emergências e desastres, conseguir pensar o trabalho, as construções e reflexão teórica que se possibilitam diretamente a partir do trabalho na ponta, no trabalho in loco, diretamente com as pessoas. Importante ressaltar também, que acaba colocando neste momento, da nossa história recente, Rio de Janeiro, como conselho de vanguarda dentro do Sistema Conselhos, ao pensar em emergências e desastres e ao refletir sobre as nossas atuações locais também”.
Em seguida, Victoria Antonieta Tapia Gutiérrez (CRP 05/20157) – conselheira coordenadora da Comissão de Emergências e Desastres – ponderou sobre a instauração e o trabalho da Comissão dentro do Conselho. “A nossa comissão foi instaurada em 2019, no XVI Plenário, mas é uma temática que o Rio de Janeiro sempre esteve muito atento. Tomamos corpo em 2019 e em 2020 veio a pandemia e ficamos afastados, mas dentre tudo, publicamos um e-book, “As Possibilidades da Psicologia em Emergências e Desastres”. Muito importante também para a nossa atuação, é a nossa Referência Técnica para atuação de psicólogas (os) na Gestão Integral de Riscos, Emergências e Desastres – disponível para download no site do CRP-RJ”.
Victoria lembrou, também, sobre a tragédia da Boate Kiss, que completara 10 anos. “No dia de hoje, 27 de janeiro de 2023, se completam 10 anos do incêndio da Boate Kiss. Um incêndio que matou 242 pessoas e feriu mais de 600, devastou famílias, uma cidade e atingiu um País. Um incêndio que foi causado por diversos motivos, que se enumerarmos, terá descaso, ganância, falta de segurança e muitas outras coisas”.
Após a mesa de abertura, foi realizada a mesa sobre a Retrospectiva das Emergências e Desastres no Brasil e no Sistema Conselhos, que recebeu as psicólogas, Débora Noal – Pós-doutorado em Saúde Mental e Desastres (FIOCRUZ), doutora e mestre em Processos de Desenvolvimento Humano e Saúde (UnB), com Doutorado Sanduíche na Division of Social and Transcultural Psychiatry (McGill University, Canadá) e Samira Younes Ibrahim – Doutoranda em Psicossociologia de Comunidades e Ecologia Social – EICOS/UFRJ, Membro da Rede de Cuidados – Psicologia em Emergências e Desastres, que apresentaram uma linha do tempo de desastres e emergências nacionais e internacionais.
Débora salientou da importância dos trabalhos e estudos das ações sobre esses desastres, como aprendizado para a forma de agir em novos casos e citou o incêndio da Boate Cocoanut Grove, em 1942, localizada em Boston, como exemplo de estratégia para o caso da Boate Kiss. Foi um desastre muito similar ao que ocorreu na Boate Kiss e é dele a estratégia que a gente ancorou e amparou à estratégia da Boate Kiss, há 10 anos atrás. Quando a gente conhece a história, a trajetória e as estratégias que foram conformadas ao longo da história, a gente agiliza, fazemos de uma forma muito mais rápida. Levamos uma de 24h à 72h para conformar a estratégia de uma cidade inteira (Santa Maria – SC). E como isso? Porquê foi possível fazer uma leitura das estratégias do passado sobre o que tinha funcionado e o que não tinha funcionado ao longo da história, assim tinha desde diários dos advogados das vítimas à relação da justiça com a saúde mental, e destaco que não tem saúde mental se não tem justiça”.
Logo após, Samira alertou, “é importante registrar que os desastres, neste momento de mundo que estamos vivendo, não dá mais para chamar esses desastres de naturais, eles acontecem pela a ação do homem, estamos produzindo tudo isso”.
A segunda mesa temática do dia, falou sobre a Atuação e Interfaces dos Saberes que Atuam em Desastres. Abrindo-a, Zarlete Faria – psicóloga, supervisora técnica da Comissão de Orientação e Fiscalização (COF) do CRP-RJ, comentou sobre a atuação do Conselho no campo dos desastres. “A Comissão de Orientação e Fiscalização reafirma que ainda que estejamos atuando em casos de emergências e desastres, devemos cumprir os princípios do Código de Ética e resoluções em vigor. Se desejamos colaborar em situação de voluntariado, precisamos nos apresentar para a equipe que está organizando os atendimentos e serviços, procurar se apresentar para as políticas públicas que estão envolvidas nas ações de apoio. Precisamos registrar as atividades realizadas tanto para fins de registro documental quanto para produzir dados para as políticas públicas. E que devemos levar em conta a privacidade das vítimas diretas ou indiretas dos fatos, respeitando a forma como eles se apresentam para o acolhimento psicológico.”.
Em seguida, Marcelo Luciano Vieira – coordenador de Pesquisas do Decanato do Centro de Ciências Biológicas e da Saúde, líder do Grupo de Pesquisas do CNPQ Josué de Castro: Engajamento Público, Pobreza e Instituições no âmbito da saúde coletiva, professor da PUC-RIO e Subdiretor do Instituto Científico e Tecnológico de Defesa Civil-ICTDEC, ressaltou a maneira do Instituto atuar. “Tanto no Instituto, quanto na própria Defesa Civil, lê desastre a partir da Legislação, então esse é o primeiro ponto que vai diferenciar a nossa leitura de desastre, tanto de você (psicólogas), quando da categoria social e outras da sociologia dos desastres, porque respondemos enquanto órgão público à Legislação. Logo, diante disso, a gente lê o desastre sob essa perspectiva”. E completou, “nessas minhas buscas iniciais, tentei descobrir a diferença entre riscos e desastres, são pontos que precisamos mapear. O risco é para impacto e o desastre é pós-impacto. Parece uma informação boba, mas é uma informação que nos dirá como atuaremos. Por exemplo, qual é a atuação pré-impacto? A prevenção! E a reação pós-impacto? A resposta. Então veja, isso vai de alguma maneira, nos ajudando”.
Fechando a mesa, Ana Cristina Araújo Pinto – médica veterinária formada pela UFRRJ, com mestrado em Medicina Veterinária pela UFRRJ, doutorado em Ciência Animal na área de Epidemiologia pela UFMG, atualmente, médica veterinária do Programa de Saúde Única do ICTB/Fiocruz, reforçou a importância do trabalho unificado das profissões em situações de emergências e desastres. “Acho extremamente importante um evento como este. Conheci a Victoria e a Ariel no desastre de Teresópolis, que tinha médico, psicólogos, nutricionista, tinham diversas formações e isso é fundamental hoje em dia. Me perguntam o que faltou na faculdade e eu digo que faltou um psicólogo, para me dizer como é que vou agir com o tutor, como vou chegar e dizer que o seu animal morreu ou está prestes a morrer. Não é fácil, faltam muitos saberes, dentro dos saberes que nós temos. Precisamos disso, é fundamental, nesses eventos não dá para todos ficarem fechados, precisamos nos unir, pois isso faz parte de uma saúde única”.
Fechando o evento, a última mesa do dia falou sobre O Processo do Luto em Situações de Emergências e Desastres, Elaine Gomes dos Reis Alves – Psicóloga especialista em Perdas, Lutos, Emergência e Desastres com pós-doutorado pelo Instituto de Psicologia USP, mestre em Bioética – USP, especialista em Gestão Integral de Risco e Desastre pela OIT-ONU, Turin, Itália, pesquisadora do Laboratório de Estudos sobre a Morte – IPUSP, coordenadora do NIPED – Núcleo de Intervenção Psicológica em Emergências e Desastres e Fundadora da Prestar Cuidados em Psicologia, pontou a diferença da Psicologia em sua atuação em emergências e desastres, se tratando do luto. “A Psicologia em emergências e desastres é diferente de todas as outras, ela é focal, ela é sentada na calçada, mas você precisa saber o que fazer e ela é efetiva, um único atendimento é de fato efetivo, isso é comprovado. É importante pensarmos que, quando iremos trabalhar com luto em desastres, estamos falando de choque, susto, medo, desespero e perda, então em todo aquele cenário, trabalharemos com o luto, mesmo que a consciência do luto ainda não esteja presente, logo, é preciso conhecer o mínimo disso e como se atua emergências e desastres”.
“O luto é um processo de começo e meio, mas sem fim. Uma vez enlutado, para sempre enlutado. O que vai mudar é o processo de elaboração do luto e não é para “aceitar”, você aprende, de alguma maneira, a se adaptar às novas situações, as pessoas se adaptam e aprendem a viver sem”, destacou.
Ao fim de cada mesa, foram abertas rodadas de perguntas para o público presente.
O evento foi transmitido através das redes do CRP-RJ e está disponível no YouTube oficial do CRP-RJ.