Esse dia contou com um plantão da Comissão de Orientação e Fiscalização – COF – do CRP-RJ. Segundo Zarlete Faria, psicóloga supervisora técnica da COF “a importância da Comissão de Orientação e Fiscalização num evento como a Mostra é que podemos nos aproximar mais dos estudantes, apresentar os pontos de vulnerabilidade da profissão e nos colocar como uma instância do Conselho que possa orientar e ser o suporte durante o exercício profissional no seu futuro trabalho”.
A apresentação de trabalhos também movimentou a parte da manhã, com muitas profissionais e estudantes de Psicologia compartilhando suas práticas e saberes, fortalecendo as práticas da profissão.
Logo após uma breve pausa para o almoço, o auditório ficou lotado para a palestra sobre Produção de Documentos, com Zarlete Faria. “Hoje nós temos 24 conselhos no Brasil e a elaboração de documentos continua sendo a maior razão de vulnerabilidade. Viemos aprendendo desde a primeira resolução de elaboração de documentos em 2000 que precisamos nos instrumentalizar para produzir relatórios, pareceres técnicos, laudos, entre outros documentos que nos são solicitados pelos mais diversos órgãos e instituições, corretamente. Este é um compromisso ético”, explicou a psicóloga.
Em seguida, teve início a apresentação da equipe do CREPOP-RJ: conselheira-coordenadora Isabel Scrivano Martins, assessoras técnicas Roberta Brasilino e Jaqueline Sério, além da estagiária de psicologia Patrícia Cardoso, com o lançamento oficial do e-book “15 anos de Crepop: A Psicologia brasileira em defesa das políticas públicas e democracia” . A primeira mesa temática, cujo nome foi o mesmo do e-book lançado, teve a presença de Lia Manso Siqueira, ativista, advogada, mestra em Direitos Humanos pela UFJF, coordenadora de projetos de Criola, que desenvolve projetos de formação, mobilização e advocacy, bem como presta orientação jurídica para mulheres que tiveram os seus direitos violados, membra fundadora do coletivo “PretAção”; Hildeberto Vieira Martins, presidente da ABRAPSO (Associação Brasileira de Psicologia Social) na gestão 2022-2023, membro do Conselho Diretor da ABRAPSO na gestão 2020-2021, como vice-presidente da Regional Rio de Janeiro, conselheiro do CRP-RJ, na gestão 2019-2022, membro da SBHP (Sociedade Brasileira de História da Psicologia), na gestão 2019-2021, psicólogo (UERJ), mestre em Saúde Coletiva (IMS-UERJ) e doutor em Psicologia Social (IPUSP), professor associado da UFF-CURO, pesquisando os temas relações raciais no Brasil, história da psicologia e psicologia social; Daniel Maribondo Barboza (CRP 05/42740), mestre e doutorando em Psicologia, autônomo e profissional do SUS na Atenção Secundária em Saúde, representante do CRP-RJ no segmento trabalhadores do Conselho Municipal de Saúde de Armação dos Búzios. A mediação foi de Patrícia Cardoso de Jesus, graduanda em Psicologia na UFRJ, integrante do Negrecs – Núcleo de estudos de gênero e relações étnico-raciais em ciências e saúde do Instituto Nutes (UFRJ), atualmente estagiária no CREPOP (Centro de Referência Técnica em Psicologia e Políticas Públicas) do CRP-RJ.
Lia Manso começou sua fala assim, “se pensarmos democracia para além das formalidades que estão colocadas institucionalmente, como parte da prática e construção de diálogo, temos algumas enunciações e vislumbramentos. O primeiro é uma pergunta: nós temos construído socialmente um espaço de prática de diálogo, um espaço efetivamente democrático? A segunda pergunta é: quem pode falar, como fala e a partir de que lugar fala nesse espaço de diálogo? A terceira é: o que é falado e como são consideradas e ponderadas as contribuições nesse espaço? Se a gente pensar na primeira pergunta, se o espaço de diálogo efetivamente existe, (…) é o espaço colocado pelos movimentos negros no seu histórico de atuação”. Lia ressaltou a importância do movimento negro e do movimento de mulheres negras, especialmente, nessa construção de espaços de diálogo. Foi por meio das lutas e conquistas destes coletivos que aumentou a visibilidade do racismo que estrutura a sociedade brasileira e que perpassa todas as relações.
Hildeberto dialogou com a fala de Lia: “ela traz esse questionamento, ela começa questionando qual é o papel da Psicologia. Eu também aprofundo a fala da Lia e pergunto: qual é o papel de um professor universitário negro que estuda o campo da Psicologia e usa como ferramenta de análise crítica o processo histórico? Eu costumo falar isso para que possamos pensar como essa Psicologia foi sendo constituída historicamente. É importante também nos perguntarmos: em que momento essa Psicologia começou a construir uma defesa pela democracia? Em que momento começou a ressignificar as suas práticas e começou de fato a construir lutas pelos direitos sociais na sociedade brasileira. Por que isso? Porque na verdade, se pensar na história da Psicologia, podemos ter dois momentos bastantes distintos: o primeiro momento é a institucionalização, essa escolarização que começa na década de 30 em uma ditadura militar, em que o papel da profissão é muito a ação do sujeito à essa realidade social”. E continuou, “o segundo momento vai emergir em um período ditatorial pós anos 60, no qual há uma certa análise crítica dessa Psicologia. Não podemos ignorar que a história da Psicologia está marcada pela formação social brasileira: ela é feita por sujeitos e esses sujeitos estão inseridos em um determinado contexto”.
Já Daniel Maribondo propôs uma reflexão sobre a relação entre a profissão e a democracia a partir do SUS – Sistema Único de Saúde: “vamos resgatar o papel do SUS nisso que tentamos construir, que é a democracia. O SUS é uma proposta revolucionária que pretende dar conta de um direito: a saúde. A partir da Constituição Federal, é uma política que vem na contramão de todo o resto que acontece desde a década de 80, que é a reafirmação de um estado neoliberal. Você ter um sistema que vai garantir saúde, vai garantir um direito para toda a população a partir de espaços de participação social, a partir da sociedade participando da decisão de para onde vai o dinheiro e como ele vai ser aplicado, isso tudo vai na contramão da política neoliberal”. “O SUS vai se sustentar em três princípios importantíssimos: a equidade, a universalidade e a integralidade. Esses são os três princípios básicos. Ainda há outros que vamos chamar de diretrizes do sistema, que são o território e a participação social. Todos esses princípios e diretrizes são peça chave para o SUS funcionar”, explicou Daniel.
O psicólogo problematizou como se dá a constituição de conselhos de direitos, órgãos que compõe o controle social, no qual há disputa de diversos interesses e visões ideológicas distintas: “É disputa o tempo todo. A única parceria real hoje no Conselho de Saúde de Búzios, onde eu atuo, por exemplo, é a Associação de Mulheres Negras e Afrodescendentes. Eu fico me perguntando o tempo todo o quanto vale a pena estar naquele espaço, pois as reuniões são canceladas, elas são adiadas, são sabotadas, algumas são marcadas de um dia para o outro. Mas, apesar disso, eu entendo que é também um espaço que devemos ocupar o máximo possível, porque se não ocuparmos, alguém vai, e vai ficar passando cheque em branco usar o dinheiro público como quiser e não executando o SUS na sua plenitude”.
E Patrícia ponderou, “a fala do Daniel nos leva muito a pensar sobre como nossa inserção nesses espaços não é somente na nossa prática isolada como psicólogos, mas elas são como nosso trabalho também. É em conjunto a outras categorias profissionais, aos movimentos sociais que estão dispostos a pensar uma real garantia de produção de saúde à população. Como a partir da fala da Lia, por exemplo, entendemos como os movimentos negro e de mulheres negras contribuíram muito participando desses espaços dos conselhos”.
É importante notar que a Psicologia, por fazer parte de todas as políticas públicas, pode e deve se fazer presente nos conselhos do controle social. Essa atuação é primordial para garantir o acesso da população aos serviços que lhe são direitos, constitucionais muitas vezes, inclusive, bem como para promover a ampliação da atuação da Psicologia nestes espaços.
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