O encontro foi o último deste Ciclo e ocupou um prédio histórico no Centro de Petrópolis, que foi atingido pelas fortes chuvas de fevereiro Na manhã de sábado do dia 6 de agosto, o Conselho Regional de Psicologia do Rio de Janeiro, por meio da Comissão Especial de Emergências e Desastres – CPED – CRP RJ, realizou a 3ª e última edição do Ciclo de Rodas de Conversa “A Psicologia em situações de Emergências e Desastres, atuação, desafios e limites”, no campus Petrópolis da Cefet, no Centro da cidade. O prédio histórico, que já foi Palácio da Justiça, Fórum, Quartel de Bombeiros e da Polícia Militar, e que hoje abriga o Centro Federal de Educação Tecnológica – Cefet, foi atingido no desastre do dia 15 de fevereiro e encontra-se ainda em reestruturação. Este foi o local escolhido pelo CRP-RJ para realizar o último encontro do ciclo que debateu e compartilhou experiências sobre a atuação da Psicologia em emergências e desastres.
Victoria Gutierrez (CRP 05/20157), abriu o evento contextualizando a CPED e explicando, “em 2019, o XVI Plenário instaura essa Comissão (Emergências e Desastres) que já vinha sendo demandada e ela é composta por pessoas, colaboradores e conselheiros de diversas regiões do Estado. Nós tínhamos um plano trabalho de rodar pelas regiões do Estado, mas em 2020 fomos todos atravessados pela pandemia. Então a nossa primeira ação acabou sendo o lançamento do e-book sobre essa atuação da Psicologia (leia aqui)”.A conselheira presidenta do CRP-RJ, Mônica Sampaio (CRP 05/44523), deu as boas-vindas ao público presente e falou da forma participativa com a qual este ciclo de debates foi construído: “Estamos aqui hoje porque um grupo de pessoas nos ajudou a construir um evento de todas nós. A importância de construir momentos como esse é que estamos também construindo saberes e produzindo conhecimento, ainda mais neste campo de atuação no qual a Psicologia se tornou tão necessária”.
Felipe Henriques, diretor do campus da Cefet, falou “perdemos muita coisa aqui e estamos na luta da reconstrução, deste prédio histórico, das nossas casas e da cidade de Petrópolis. Estamos caminhando, mas foi uma tragédia que não trouxe só perdas materiais. Algumas perdas não poderão ser reconstruídas”.
Mariana Rocha, fotógrafa e historiadora que realizou um registro fotográfico de diversas regiões atingidas. No trabalho apresentado, Mariana demonstrou seus registros e fotos de antes da tragédia, conseguida por meio do Google Maps. O registro visual no Morro da Oficina é impactante. “Eu perguntei para ela (moradora) qual era o sonho da vida dela e ela me respondeu que era ‘ter sua rua calçada com escadas seguras para ela poder chegar em casa’. Ouvir isso mexeu muito comigo, porque se me perguntarem qual o sonho da minha vida, eu vou responder sobre algo meu, pessoal. E ela não. Ela sonhava pela comunidade, pelos vizinhos. Para essas pessoas perder seus espaços, perder seus vizinhos é muito grave”, relatou Mariana emocionada.Em seguida, a mesa temática foi composta por Maria Zenith Nunes Carvalho (CRP 95/7964), psicóloga clínica, chefe do Núcleo de Educação em Saúde -Superintendência de Planejamento e Apoio e a Gestão da SMS; Samira Younes Ibrahim (CRP 05/7923), doutoranda em Psicossociologia de Comunidades e Ecologia Social (EICOS-UFRJ), membro da Rede de Cuidados/Psicologia em Emergências e Desastres; Victoria Antonieta Tapia Gutiérrez (CRP 05/20157), conselheira do XVI Plenário do CRP RJ, coordenadora da Comissão Gestora da Região Serrana, coordenadora do Eixo de Políticas sobre Álcool e outras Drogas e da Comissão Especial de Psicologia em Emergências e Desastres do CRP-RJ; Thaís Vargas Menezes (CRP 05/33228), conselheira da XIV Plenária, coordenadora da Comissão de Orientação e Fiscalização – COF. Com a mediação de Ariel Pontes (CRP 05/64806), psicóloga/UFRJ que coordenou o Programa de Restabelecimento de laços Familiares (RLF) da Cruz Vermelha Brasileira – Rio de Janeiro, pós-graduada em Psicologia das Emergências e Desastres e em Defesa civil / Unyleya, pesquisadora do Grupo de ensino, extensão e extensão de saúde em emergências e desastres (GEPESED- UFRJ) e colaboradora da Comissão Especial de Emergências e Desastres do CRP-RJ. Victoria ressaltou a questão do voluntariado, que foi uma questão muito marcante durante o evento de fortes chuvas que atingiram a cidade em 15 de fevereiro deste ano. “As pessoas queriam ajudar, mas para ajudar precisamos nos organizar. Houveram situações que as pessoas organizaram ‘caravanas’ para vir para cá, sem ter a menor noção de reconhecimento do território. Das necessidades das pessoas atingidas. Ouvi dizerem que estavam vindo para Petrópolis porque aqui não tem psicólogos. A cidade de Petrópolis é a cidade da Região Serrana que possui o maior número de psicólogas (os) atuando”. “Infelizmente, vimos pessoas, profissionais, querendo usar a tragédia para autopromoção. E isso, é inclusive anti-ético e fere o que preconiza o nosso Código de Ética profissional”, ressaltou Victoria.
Maria Zenith reforçou o que Victoria falou sobre o voluntariado e o trabalho da Psicologia, que deve ser desenvolvido de forma séria e ética, mesmo num contexto caótico: “É importante entender que a atuação da Psicologia no âmbito de emergências e desastres é fundamental, mas deve ser realizado com seriedade e organização, até para não produzir maior sofrimento.
É preciso ter projeto, quando se faz um trabalho que terá início, meio e fim. A Secretaria (de Saúde) cadastra profissionais e organiza essa atuação. Não podemos realizar um trabalho tão sério de forma aleatória e desorganizada. Tivemos relatos de pessoas em abrigos que receberam a visita de mais 5 psicólogos e não aguentavam mais responder as mesmas coisas.
Isso não produz acolhimento, produz sofrimento”.
Marcia Fernandez, psicóloga atuante no NASF, convidada por Zenith, trouxe seu relato de atuação durante o desastre de fevereiro. “Realizei tudo o que eu podia com PAP (Primeiros Auxílios Psicológicos ou pode ser lido como PSP, primeiros socorros psicológicos) e depois começamos um trabalho multisetorial, com assistentes sociais, inclusive, para realizar o cadastro das famílias, para aluguel social, entre outros direitos que precisavam ser viabilizados.
Foi extremamente desafiador”, pontuou a psicóloga. Samira reafirmou a importância do SUS – Sistema Único de Saúde – também no contexto de risco: “O SUS já está lá, e está em todos os municípios, em todas as regiões. Ele conhece o território antes do desastre. É importante entender que isto é fundamental para a prevenção, pois atualmente não existe mais desastre natural. Não é do campo do imprevisível. Os desastres têm local e época do ano para acontecer. Não é fácil, mas precisamos falar disso: é necessário prevenir, pois os mais vulneráveis são sempre os mais atingidos e isso não é por acaso. Se pensarmos até no desastre que é a pandemia, vemos que ela trouxe uma grande lupa sobre as desigualdades sociais e as vulnerabilidades”.
Logo depois, Thaís trouxe uma visão sobre como é fundamental o trabalho em rede no acolhimento às pessoas atingidas por desastres, pois a partir da ocorrência diversas vulnerabilidades, conforme também apontado por Samira, afloram e a necessidade de serviços diversos fica nítida. As atuações devem ser em rede e o acolhimento deve ser continuado, daí a importância das políticas públicas: garantir esta continuidade, para que não haja a produção de mais uma violência, num contexto já tão doloroso. Além disso, Thaís chamou atenção para a importância de se observar as normativas que guiam a atuação da Psicologia: “Precisamos olhar para o nosso Código de Ética e respeitar, aquilo é nossa responsabilidade. Uma das nossas responsabilidades é saber o que estamos fazendo, ter clareza da nossa atuação naquele espaço. Se entendemos que não temos ferramentas para lidar com a situação, o encaminhamento é a coisa mais importante de ser feita. Observar as normativas, observar o conhecimento já sistematizado, se capacitar, é primordial para desempenhar o trabalho”.O evento finalizou com uma grande troca de experiências entre o público presente e as palestrantes, enquanto a neblina branca cobria o entorno do prédio histórico, no começo de tarde de sábado.
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“A PSICOLOGIA EM SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIAS E DESASTRES, ATUAÇÃO, DESAFIOS E LIMITES” TEM SUA 3ª EDIÇÃO EM PETRÓPOLIS
Data de Publicação: 10 de agosto de 2022