O Conselho Regional de Psicologia do Rio de Janeiro (CRP-RJ), por meio da Comissão de Direitos Humanos, realizou no dia 18 de maio, o evento “Os caminhos da Psicologia: memória, verdade e justiça”, na Universidade Castelo Branco (UCB) em Realengo, Zona Oeste do Rio de Janeiro.
Com o auditório lotado, o evento debateu com as(os) profissionais e estudantes a atuação da Psicologia no âmbito da defesa dos direitos humanos, contextualizando o exercício da categoria em períodos anti democráticos e como esse papel se reverbera até os dias atuais. A atividade reforçou também a importância das políticas públicas nas lutas antimanicomial e anticapacitista e como os movimentos sociais foram imprescindíveis para as conquistas e avanços dessas lutas.
Para acompanhar na íntegra como foi o evento, acesse o canal oficial do CRP-RJ no YouTube.
Mesa de Abertura Institucional
O evento iniciou com a mesa institucional, composta por Céu Cavalcanti (CRP 05/57816), conselheira presidenta do CRP-RJ, Conceição Gama (CRP 05/39882), conselheira, coordenadora da Comissão Regional de Psicologia e Direitos Humanos e do Eixo de Políticas para as Mulheres do CRP-RJ, Mônica Sampaio (CRP 05/44523), coordenadora da Comissão de eventos do CRP-RJ e integrante da Comissão dos Direitos Humanos do Conselho Federal de Psicologia (CFP), Talita Baldin (CRP 05/47235), mestre e doutora em Psicologia pela Universidade Federal Fluminense, docente de graduação e pós-graduação e coordenadora do curso de graduação em Psicologia da Universidade Castelo Branco. A mesa contou também com a presença de Maycon Pereira (CRP 05/57178), conselheiro, coordenador do Eixo de Políticas e Práticas Anticapacitistas, e coordenador adjunto da Comissão Intergestora de Regionalização e Descentralização – CIRD do CRP-RJ, o conselheiro atuou como apresentador do evento e mediador da mesa de abertura.
A mesa de abertura institucional abordou a importância de, através da memória, analisarmos a história para entender que nenhum direito conquistado é garantido, nesse ponto a luta para manutenção dos direitos humanos se torna imprescindível e as políticas públicas se inserem como alternativa e solução para a garantia desses direitos.
Em sua fala, a coordenadora da Comissão de Eventos Mônica Sampaio relatou a importância dos temas abordados pelo evento, como a luta antimanicomial e as dificuldades que as mulheres enfrentam no mercado de trabalho. Sampaio também expôs as etapas das ações de mobilização do COREPSI (Congresso Regional de Psicologia).
Em seguida, Talita Baldin, afirmou que debates como esse, que refletem a memória, são fundamentais, pois pensar a democracia é pensar que todos têm espaço para serem ouvidos. A coordenadora ressaltou que é necessário que se entenda, através da história, que nenhum direito conquistado é garantido, temos que lutar pela manutenção deles.
Em sua participação por vídeo, a conselheira Conceição Gama dedicou o evento à memória das vítimas da ditadura militar e aos sobreviventes da tentativa de aniquilamento. Gama aconselhou a plateia a refletir sobre os temas profundos abordados no evento e reafirmou que tortura é inadmissível e que cuidado se faz em liberdade. A conselheira agradeceu a todas(os) envolvidas na organização do evento.
A conselheira presidenta do CRP-RJ, Céu Cavalcante, também participou do evento por vídeo. A presidenta desejou que a palavra circulada no evento construa um saber em comum e que esse saber seja apenas uma semente de um conjunto de composições, feitas entre a comunidade, o CRP, a pessoa profissional e a pessoa estudante.
Oficina de mediação de conflitos
Após a mesa de abertura institucional, o evento contou com uma oficina ministrada por mediadoras(es) da Comissão de Meios e Soluções Consensuais de Conflitos (COMSCC) do CRP-RJ. São eles, Juliana Pereira (CRP 05/29063), conselheira e coordenadora da COMSCC do CRP-RJ, Pedro Aquino, advogado colaborativo, mediador do CRP-RJ, colaborador da COMSCC, Renata Santos, membro da COMSCC, Mariana Vilhena, advogada e mediadora e Fernanda Ripper advogada e mediadora.
As(os) participantes explicaram como a COMSCC atua no intermédio de conflitos, através de casos onde o denunciante afirma que a(o) psicóloga(o) cometeu uma infração ética, nesse ponto as partes envolvidas são chamadas para conversar e a(o) mediadora(o) tem a função de conduzir o diálogo, ressignificando aquele conflito e positivando a situação, propondo uma cultura de paz e de direitos humanos.
Sobre a atuação da(o) mediadora(o) nas situações de conflito, Juliana Gabriel afirma que a(o) mediadora(o) tem uma escuta empática para acolher a história do outro, tudo que o outro diz é uma verdade pela forma que ele viveu e sentiu aquela situação.
Na oficina, foi realizada uma dinâmica onde a plateia se dividiu em grupos, para discutir entre si episódios de injustiças vivenciados no cotidiano. Após esse momento, as(os) mediadoras(es) pediram para o público relatar a necessidade que identificou no momento em que seus colegas expuseram a situação de injustiça vivenciada. As(os) mediadoras(es) ressaltaram que a COMSCC atua justamente identificando essa necessidade de escuta e acolhimento das partes envolvidas em um conflito, com a intenção de corrigir o erro e aprender com ele e não apenas ressaltando uma cultura punitivista, pois essa cultura gera ainda mais o sentimento de injustiça.
Mesa 1 – As Amarras de Ontem e Hoje: Ditadura e Manicômio Nunca Mais
A primeira mesa “As Amarras de Ontem e Hoje: Ditadura e Manicômio Nunca Mais” contou com a participação de Matheus Branco Leal (CRP 05/55287), coordenador Adjunto do Núcleo de Psicologia, Saúde e Saúde Mental do CRP-RJ, Héder Bello (CRP 05/51594), coordenador do Eixo de Laicidade do CRP-RJ, Bento Rezende de Araújo (CRP 05/64776), colaborador do eixo de Gênero e Diversidade Sexual do CRP-RJ, contou com a participação por vídeo de Cecília Coimbra (CRP 05/1780), professora aposentada da UFF, vinculada à Pós-Graduação de Psicologia, fundadora e atual membro da diretoria colegiada do Grupo Tortura Nunca Mais/RJ e contou também com a mediação de Maycon Pereira.
O objetivo da mesa foi analisar, através de fatos históricos, o papel da Psicologia junto à reforma psiquiátrica brasileira, e em conjunto ao processo de construção e manutenção de direitos, apontando para uma atuação nas políticas públicas como um caminho para a garantia dos direitos humanos.
Em participação por vídeo, Cecília Coimbra abordou, a partir da sua vivência durante a ditadura militar, o papel que a Psicologia exerceu no país nesse período. Ela afirma que durante a ditadura, houve um aumento de instituições particulares de Psicologia, com matérias onde não se podia falar sobre o momento de terror que o Brasil vivia. Esse contexto estimulava que sujeito fosse visto como uma coisa em si, desvinculada do contexto social e cultural que o atravessava e até hoje temos muito resquícios dessa conduta na atuação da Psicologia. A professora ressalta a importância de entender que não somos sujeitos isolados do nosso contexto social, e é imprescindível que a Psicologia trate o indivíduo como um sujeito produzido socialmente.
O evento ocorreu na semana da luta antimanicomial, celebrada no dia 18 de maio. Fazendo um paralelo com a data, Matheus Leal abordou como a reforma psiquiátrica e a luta antimanicomial estão em processo no Brasil e ressaltou também que precisamos repensar de maneira crítica o fazer das formações, porque se não for dessa maneira o manicômio se transforma em medicalização e psiquiatrização da vida, e se mantém em uma sociedade que não sabe lidar com o sofrimento produzido por uma cultura LGBTfóbica, racista, de intolerância religiosa e de não reconhecimento do processo de construção do Brasil.
Internado por sua família por conta da não aceitação da sua identidade de gênero e orientação sexual, Bento Rezende compartilhou sua vivência como homem trans para o público. O psicólogo endossou que as instituições manicomiais estão diretamente vinculadas à exclusão da sociedade, portanto envolvida nas questões de gênero, raça, sexualidade, classe, entre outros.
Em seguida, o colaborador do CRP-RJ Héder Bello descreveu a sua experiência como sobrevivente da “terapia” de conversão sexual, uma prática de violação dos direitos humanos que se constitui como uma tentativa de aniquilamento da sexualidade do indivíduo. Sobre o papel da Psicologia nesse contexto, o colaborador ressaltou que temos uma tarefa ética sobre que tipo de Psicologia a categoria quer produzir para pensar além de adaptar o sujeito a uma determinada norma e sim produzir uma Psicologia que entende o sujeito através de sua diversidade.
Mesa 2 – As Pessoas com Deficiência em Períodos Anti Democráticos e Progressistas: Avanços, Movimentos Sociais e Políticas Públicas no Brasil
A segunda mesa contou com a participação de Sara York, doutoranda e mestra em Educação, especialista em gênero e sexualidades, membro co-fundadora da câmara de implementação de políticas afirmativas antirracistas e interseccionais e membro da comissão de diversidade, acessibilidade e ações afirmativas da associação nacional de pós-graduação e pesquisa em educação da UERJ, Edireuza Fernandes (CRP 16/3016), conselheira presidenta da Comissão Psicologia e Pessoas com Deficiência do CRP-ES, compondo também o Grupo de Trabalho de Orientação: Atuação com Pessoas com Deficiência do Conselho Federal de Psicologia (GT/CFP) representando os conselhos regionais da região sudeste pelo CRP-ES e integrante da Comissão de Educação, presidenta da Comissão de Patrimônio do CRP-ES, foi conselheira titular no Conselho Estadual dos Direitos da Pessoa com Deficiência do ES, representando o CRP-ES e do conselheiro Maycon Pereira.
O objetivo da mesa foi apontar a memória e a história no decorrer da luta anti capacitista, expondo desafios e avanços que atravessam a luta.
Em sua fala, Maycon Pereira ressalta que devemos pensar a inclusão a partir da ótica da democracia, do contrário a gente vê manicômios que tutelam pessoas com deficiência e que a Psicologia contemporânea deve se comprometer com a luta pela inclusão, pois ela não é um favor, e sim um direito.
Em seguida, Sara York divulgou o ensaio teórico que ela participou da criação. Gramática do Capacitismo, foi criado em 2016, em uma época em que poucas pessoas conheciam o termo. A professora ressalta que o texto aborda os marcadores sociais da diferença e aspectos retilíneos de expressão de gênero vendidos como naturais, fator que nos leva a presunção de achar que sabemos quem é o outro. Ela endossa que nesse contexto os corpos com deficiência também buscam saber onde é o seu lugar, em uma sociedade que defende uma lógica que não é coerente.
E contextualizando a luta pelo protagonismo e direitos da pessoa com deficiência, Edireuza Fernandes expõe avanços na luta, como o deslocamento da pauta do campo assistencialista para o campo dos direitos humanos. Ela afirma que os atores do movimento político da pessoa com deficiência continuam firmes e atentos na afirmação de sua identidade e de seus direitos, e cabe à sociedade e ao Estado ouvir o que os movimentos têm a dizer, pois a luta pela garantia de direitos ainda é necessária.
Mesa 3 – Mundo do Trabalho para Mulheres
A terceira mesa abordou o tema “Mundo do Trabalho para Mulheres” e teve como objetivo o aprofundamento dos aspectos do trabalho na Psicologia para as mulheres, considerando o panorama atual da profissão no Brasil. Integraram a mesa, Naura Americano (CRP 05/12928), mestre em Mediação de Conflitos, mediadora e supervisora de Mediação de Conflitos no TURJ e sócia fundadora da Sociedade de Mediação de Conflitos, Alfredo Assunção (CRP 05/60474) conselheiro, coordenador da Comissão de Psicologia e Trabalho Condições Processos e Organizações e coordenador do Eixo de Gênero de Diversidade do CRP-RJ. A mesa contou com a mediação de Juliana Gabriel (CRP 05/29063), conselheira e coordenadora da COMSCC do CRP-RJ e com a apresentação de Mykaella Moreira dos Anjos, estudante de Psicologia.
A apresentadora da mesa Mykaella Moreira enfatizou a importância desses debates com vistas a produzir uma Psicologia outra que se implica com a transformação da realidade brasileira.
Em seguida, o conselheiro Alfredo Assunção abordou em sua fala dados que comprovam que as mulheres constituem um percentual de 80% da categoria de Psicologas(os), sendo 79,9% o total de mulheres cis gênero e 0,1% de mulheres transgênero. Assunção ressalta a realidade de sucateamento e precarização da profissão, realidade essa que faz com que muitas(os) profissionais se dividam em mais de um emprego para compor sua renda. O conselheiro também afirmou que profissionais enfrentam entraves políticos na luta pelos seus direitos e que a categoria precisa pensar e lutar por condições dignas de trabalho já na sua formação.
Reforçando os dados apresentados por Assunção, a conselheira e mediadora da mesa, Juliana Gabriel, ressaltou o dado apresentado que mostra que 80% da categoria atua em consultórios particulares e 60% em políticas públicas. A mediadora evidenciou que a conta não fecha e que esse dado comprova a realidade de profissionais que se dividem em mais de um emprego, reiterando o que foi dito anteriormente por Assunção.
Fazendo uma ligação com a oficina de mediação de conflitos, Naura Americano ressaltou a mediação, como um campo que está em expansão e deve ser ocupado, sobretudo por quem tem formação em Psicologia. A mediadora explicou como o processo de mediação se estrutura, apresentando diferentes estratégias de enfrentamento de conflito e expôs o papel do mediador no auxílio na dissolução do problema em questão.
Ao final de cada mesa, a plateia pode deixar sua contribuição e esclarecer suas dúvidas com os participantes do evento.
Fique atenta(o) as redes sociais para acompanhar a agenda dos próximos eventos produzidos pelo CRP-RJ em sua região!