A mesa de debates “Transversalidade no SUAS” abriu a parte da tarde da 3ª edição do Seminário de Psicologia na Assistência Social, que ocorreu no dia 27 de outubro, na UERJ. Os palestrantes da mesa foram Jaqueline Gomes de Jesus, professora de Psicologia do Instituto Federal do Rio de Janeiro (IFRJ), Fabiane de Souza Vieira (CRP 05/28527), colaboradora do CRP-RJ no Eixo de Psicologia e Laicidade da Comissão Regional de Direitos Humanos, e José Henrique Lobato Vianna (CRP 05/18767), conselheiro-coordenador do Eixo de Psicologia e Laicidade da Comissão Regional de Direitos Humanos do CRP-RJ. A mesa foi mediada pela psicóloga e colaboradora do CRP-RJ Paula Smith (CRP 05/34667), membro da Comissão de Psicologia e Assistência Social.
Jaqueline abriu o debate falando sobre a situação na qual a população LGBT+ se encontra dentro do atendimento das políticas de Assistência Social. A psicóloga apresentou estatísticas aterradoras: “o Brasil é o país que mais mata pessoas trans no mundo, principalmente mulheres. Só nesse ano 145 mulheres trans foram assassinadas. É um feminicídio, na realidade, um transfeminicídio”.
“Se fala muito da questão da invisibilidade das minorias, mas nós somos visíveis até demais, porém no campo do exótico. Invisível é a nossa luta pela igualdade de direitos. O nível do exótico precisa ser superado, nosso objetivo é chegar ao paradigma da equidade, no qual poderemos ser vistos e vistas como ser humanos como outros quaisquer portadores dos mesmo direitos e deveres que qualquer um, seja hetero, cis, homo ou trans”, concluiu Jaqueline.

Da esq. para dir.: José Henrique, Paula, Jaqueline e Fabiane
Fabiane falou da questão da intolerância religiosa que atravessa não só a vida dos usuários do sistema, mas muitas vezes atravessa o próprio atendimento dentro de um equipamento de Assistência Social, produzindo uma violência. “A intolerância religiosa é um tema invisível na política pública. Parece que não existe. Porém, temos casos como o de uma mãe que perdeu a guarda do filho porque na audiência trajava suas vestimentas e turbantes brancos. Isso fez a juíza considerar que ela não tinha condições psíquicas e psicológicas de cuidar do filho. Ainda bem isso pode ser revertido. Mas vivemos num momento em que é aceitável uma postura como essa sem uma discussão maior”, contou.
“Precisamos desnaturalizar a hegemonia de determinadas correntes religiosas. Na realidade, a vulnerabilidade social da população negra é atravessada por diversas questões que são naturalizadas, como a pobreza historicamente construída e alimentada e a própria intolerância religiosa”, concluiu.
José Henrique falou sobre a questão da laicidade na Psicologia e nas políticas de Assistência, problematizando o conceito da religiosidade nas esferas públicas. “A religiosidade é vista como algo da intimidade, da esfera íntima e pessoal de uma pessoa. Porém, as pessoas religiosas foram tomando lugares e assumindo postos e, mais que isso, foram ampliando a esfera de atuação da sua religiosidade. Hoje temos um prefeito que é de uma tradição religiosa que tem toda uma entrada no campo da política. Essa política já acontece há um tempo e também ocupa a própria Psicologia”, ressaltou.
“E quando alguns temas que são caros a todos nós começaram a ser confrontados com a questão da religião, visões de mundo conflitantes, é que todos passaram a prestar a atenção que determinados lugares estão sendo ocupados tendo forte influência religiosa. O profissional da Psicologia pode ter a religião e fé que lhe convier, mas sua atuação científica deve ser laica, assim como qualquer político”, finalizou o psicólogo.
Paula Smith, que mediou a mesa, pontuou “que o Estado não seja o primeiro violador. As questões trans, gênero, etnia, religiosa, entre outras tantas outras, perpassam os equipamentos de políticas públicas e isso precisa ser discutido e problematizado. Temos que desnaturalizar certos conceitos. Lembro de uma citação de Deleuze, ‘para criar outro mundo, é preciso criar outros conceitos’. Vamos lutar para construir o mundo que queremos viver”.
Por fim, Juliana Gomes (CRP 05/41667), conselheira-presidente da Comissão de Psicologia e Assistência Social, concluiu “todos nós, negros, trans, e minorias em geral, precisamos sair do exótico e conquistar o lugar de fala da academia, pois é assim através de pesquisas, livros, artigos, ou seja, da produção acadêmica em relação com a prática, que construiremos esses novos conceitos”.