auto_awesome

Noticias






“As práticas da Psicologia em tempos de neoliberalismo” é tema da conferência de abertura da 11ª Mostra


Data de Publicação: 27 de julho de 2017


“A evolução do capitalismo transformou-se nessa barbárie fascista a que se dá o nome de neoliberalismo”, declarou o psicanalista e professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro Luciano Elia durante a conferência de abertura da 11ª Mostra Regional de Práticas em Psicologia, na noite do dia 19 de julho.

A palestra do professor da UERJ teve como tema “As práticas da Psicologia em tempos de neoliberalismo” e objetivou abordar a atual conjuntura social, econômica e política no Brasil e no mundo e como isso afeta a prática da Psicologia.

“O neoliberalismo é uma contradição. O termo ‘neo’, que, sozinho, significa ‘novo’, na verdade contradiz o termo liberalismo. O neoliberalismo negou o liberalismo a ponto tal que o esgarçou, extinguindo a própria ideia de liberalismo”, defendeu. “É verdade que o liberalismo jamais conjugou-se bem com a questão da liberdade. O liberalismo, essencialmente burguês, tem a ver com a liberdade individualista”.

“Marx já provou, de forma cabal e incontornável, que a liberdade econômica leva à privação de liberdade de acesso da maior parte da população aos benefícios econômicos, ou seja, gera uma pobreza estrutural, necessária ao sistema. Portanto, o próprio liberalismo é solidário da acentuação da injustiça social e da divisão acirrada de classes”, argumentou Elia.

Em seguida, o psicanalista abordou como o campo da Psicologia – o qual, conforme ressaltou, “é um campo essencialmente crítico” –, pode responder a tudo isso. “A Psicologia tem historicamente representado um campo de saberes e práticas de resistência e de crítica política, a despeito de algumas de suas vertentes, como em todos os campos, que se afeiçoam de maneira particular ao exercício do poder estabelecido”, afirmou ele.

IMG_1685“Escolhi analisar os efeitos do neoliberalismo no campo da Saúde Mental. Um campo no qual um número muito grande de psicólogos atua”, pontuou Elia. “Na esteira histórica da Reforma Sanitária brasileira, que criou o SUS e foi uma das principais trincheiras da luta contra a ditadura militar, como traço forte dessa resistência, temos a Reforma Psiquiátrica, que, durante muitos anos, foi bem sucedida no Brasil, sobretudo graças aos psicólogos”.

Ainda segundo o psicanalista, “o processo neofascista, dito neoliberal, promove incessantemente a judicialização e a criminalização de questões psicossociais”. Conforme explicou, é nesse contesto que ganha força o retorno das forças manicomiais no Brasil.

“As forças manicomiais retomaram terreno pelo vertente do uso abusivo de drogas, inventando a epidemia do crack, fazendo terrorismo sanitário e moral e, com isso, fazendo o desmonte da lógica de atenção psicossocial. É claro que isso atende a princípios fascistas, afinal, quem são os usuários de drogas em sua maioria? É a população jovem, negra e de periferia urbana”, disse.

A seguir, Elia teceu críticas contundentes ao discurso cientificista, atualmente em voga, que supostamente justifica práticas de higienismo, criminalização e medicalização. “Qual é a lógica e o sentido científico da afirmação de que esses jovens sofrem de dependência química? Isso é dito e soa científico. Vivemos uma época de falsa ciência. E isso também nos afeta porque existe uma suposta ‘ciência psicológica’ que se apresenta como ciência, mas não é ciência, como a neurociência do comportamento, por exemplo, que envolve muitos psicólogos e tem uma proposta completamente contrária a tudo que seja combativo”.

“É preciso tomar cuidado com essa ciência atrelada ao capital. A indústria farmacológica é a mais rentável atualmente, tendo ultrapassado a indústria de armamento. Então, quando se fala em ‘guerra às drogas’, se você tirar a preposição, você tem ‘guerra’ e tem ‘droga’, dois termos que designam os dois maiores alvos do capitalismo atual, a indústria farmacológica e de armas. E não podemos esquecer que a guerra interessa ao neoliberalismo”, advertiu Elia, que pontuou ainda que “os psicólogos podem muito em suas práticas, desde que se mantenham críticas e combativas”.

 



IMG_1685-1024x683.jpg