
A roda de conversa aconteceu no auditório da sede do CRP-RJ
Em comemoração ao Dia do Psicólogo Latinoamericano – fixado em 8 de outubro pela União Latinoamericana da Psicologia (ULAPSI) – o CRP-RJ promoveu, no último sábado, 8 de outubro, no auditório da sua sede, na Tijuca, a Roda de Conversa “A Conjuntura Brasileira Atual: questões para a Psicologia e para psicólogas (os)”.
Coordenada pela psicóloga e conselheira-presidente do CRP-RJ, Diva Lúcia Gautério Conde (CRP 05/1448), a roda de conversa contou com falas de Luís Alberto Nogueira Alves, professor da Faculdade de Letras da UFRJ, Janne Calhau Mourão (CRP 05/1608), ex-presidente do CRP-RJ e membro da Equipe Clínico-Política do RJ, e Marinaldo Santos Silva (CRP 05/5057), presidente do Sindicato dos Psicólogos do Estado do Rio de Janeiro (SINDPSI-RJ).
O evento tambémcontou com participação das psicólogas Rita de Cássia Louzada (CRP 05/11838), conselheira do CRP-RJ e representante do núcleo Rio de Janeiro da Associação Brasileira de Ensino de Psicologia (ABEP), Carolini Cunha, representando o núcleo Rio da Associação Brasileira de Psicologia Social (ABRAPSO), e Fernanda Magano (CRP 06/41191), presidente do Sindicato dos Psicólogos do Estado de São Paulo.
Análise da conjuntura política

Debatedores da roda de conversa (da esq. para dir.): Diva, Luís Alberto, Janne e Marinaldo
A primeira fala da mesa foi de Luís Alberto, que fez uma minuciosa análise do processo social, político e econômico que culminou no impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff. “Como explicar uma mudança tão drástica na situação do país depois de um governo que, entre prós e contras, conseguiu desenvolver e implementar políticas cujo propósito era tirar da situação de miséria milhões de brasileiros?”, questionou o professor, dando início à sua fala.
De acordo com a análise feita por Luís Alberto, os golpes de Estado não são uma exceção na história recente de nosso país. “No Brasil, a coisa mais certa é que, em algum momento da história, vai acontecer um golpe. Se tomamos como base de 1930 para cá, quando houve a chegada do primeiro governo de Getúlio Vargas, tivemos uma sucessão de golpes ou de tentativas de golpe. A rigor, se fizermos uma contabilidade, os períodos de democracia são tão menores do que os períodos não democráticos que isso nos leva a concluir que, no Brasil, a democracia é quase uma exceção”.
“A partir de 1945, temos um ciclo de grandes reformas que vai culminar num processo de crescente radicalização com a tentativa de João Goulart de levar à frente as chamadas Reformas de Base. Nesse momento, quando Jango se compromete a levar adiante essas reformas que alterariam as bases estruturais da sociedade brasileira, as elites começam a se articular. O golpe de 1964 acontece a partir de uma teia de articulação fantástica dos setores conservadores”, descreveu Luís Alberto.
Para o professor da UFRJ, o embrião para o golpe que tirou Dilma Rousseff da presidência da República foram as manifestações populares de julho de 2013. “As jornadas de julho de 2013 foram o ovo da serpente. A direita e os demais setores conservadores já vinham se articulando antes e, a partir das manifestações, encontraram o momento preciso para entrar em cena. É a partir dali que esses setores vão ganhar espaço no interior da sociedade”.
Produção de subjetividades
Janne, por sua vez, destacou a importância central que a produção de subjetividades desempenha nas articulações políticas dos setores conservadores que deram origem tanto ao golpe civil-militar de 1964 quanto ao impeachment de Dilma Rousseff. Conforme destacou, “a democracia prevê disputas o tempo inteiro. E nós acabamos arrefecendo nessas disputas. Talvez pensamos que a simples implementação de programas e políticas públicas, por si só, deixaria claro que o governo, voltado para essas questões sociais, traria benefícios para as camadas minorizadas da população”.
“A questão de subjetividades é uma questão muito importante e, apesar disso, a Psicologia ainda discute pouco. A produção de subjetividades é uma disputa. Você não ganha uma guerra apenas pela força, mas ganhando os corações e as mentes das pessoas: isso é produção de subjetividades”, acrescentou.
“Dentro do esquema capitalístico e globalizado”, argumentou Janne, “qualquer ruptura é facilmente capturada e isso é um ciclo permanente de luta e disputa. Precisaremos sempre encontrar novas formas de ruptura para o que vai sendo instituído”.
As circunstâncias para o golpe

Rita Louzada e Carolini Cunha (duas primeiras da dir. para esq.) marcaram presença no evento representando, respectivamente, a ABEP e a ABRAPSO
“Estamos vivendo uma ditadura e isso é real”, afirmou Marinaldo, último convidado a falar. Para o presidente do SINDPSI-RJ, “vivemos sob uma repressão que, de forma geral, não é percebida porque não é noticiada, pois as coisas atualmente só são percebidas se forem noticiadas”. Em seguida, Marinaldo apontou o que, em sua avaliação, foram os dois principais equívocos do governo do ex-presidente Lula e que terminaram contribuindo de forma decisiva no processo que levou ao impeachment de Dilma Rousseff.
“O primeiro equívoco diz respeito às lideranças. Quando o Lula assumiu, ele levou todas as lideranças dos movimentos sociais para o governo e acabou deixando um vácuo de formação. Com isso, as pessoas que assumiram as lideranças dos movimentos sociais não conseguiram dar continuidade ao trabalho de mobilização das massas. O segundo equívoco foi a opção do governo em fazer a inclusão das parcelas mais pobres da população pelo consumo. Ao se optar em incluir pelo consumo, não se fez uma politização dessas populações”, apontou o presidente do SINDPSI-RJ.
“Quando o PMDB apresentou para a então presidente Dilma o documento ‘Ponte para o Futuro’, contendo as teses e diretrizes neoliberais para serem seguidas pelo governo, ela se recusou a implementá-las. Foi a partir daí que se começa a orquestrar o golpe. E a imprensa e o Judiciário tiveram papel fundamental nesse processo”, acrescentou.
Implicações da Psicologia
Durante o debate entre os participantes, as representantes da Associação Brasileira de Ensino de Psicologia (ABEP) e da Associação Brasileira de Psicologia Social (ABRAPSO) fizeram importantes colocações a respeito de como esse cenário afeta a Psicologia e as (os) psicólogas (os).
Rita Louzada, da ABEP, ponderou que o atual cenário político, social e econômico do país representa um desafio para a formação em Psicologia. Segundo ela, “nossa luta é para que essas questões sejam inseridas e debatidas na graduação em Psicologia”.
Carolini Cunha, da ABRAPSO, enfatizou que “mais do que um golpe à democracia e àquilo em que acreditamos, o impeachment da ex-presidente Dilma é também um golpe aos nossos empregos, já que boa parte dos psicólogos atuam junto às políticas públicas, que estão sendo esvaziadas e precarizadas”.