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“O que quer o ‘Escola sem Partido’ no atual contexto político?” é discutido na 2ª mesa do evento


Data de Publicação: 21 de setembro de 2016


A segunda mesa de debates que ocupou o auditório da UniRio, na tarde do dia 16 de setembro, trouxe o tema “O que quer o ‘Escola sem Partido” no atual contexto político?”.  O auditório lotado de educadores, psicólogas (os) e estudantes puderam participar da discussão com os palestrantes Fernando de Araújo Penna, professor da UFF, Malvina Tuttman, professora da UNIRIO, Leonardo Castro, professor da UNIRIO e Breno Brizola, estudante secundarista. A mesa foi coordenada por Helena Rego Monteiro (CRP 05/24180), psicóloga e conselheira-presidente da Comissão de Psicologia e Educação do CRP-RJ.

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Helena Rego Monteiro, conselheira-presidente da Comissão de Psicologia e Educação do CRP-RJ

Helena foi a primeira a falar, contextualizando o momento histórico da Educação no Brasil. “Temos vivido, nas últimas décadas, uma avalanche de projetos produzidos tanto pelas instituições privadas quanto públicas que são literalmente despejadas na rede de ensino. Podemos contabilizar cerca de mil projetos tramitando, nos últimos 10 anos, nas esferas legislativas. A maioria desses projetos versam sobre mudanças na grade curricular. Aqui, vale lembrar que definir o conteúdo da Educação não é de competência do legislador, mas sim de educadores”, explicou.

“Ainda nesse contexto, contabilizamos seis propostas que versam sobre o ‘Escola sem Partido’. Esses PLs pedem punições a professores que emitam opinião política em sala de aula, e há também aqueles que clamam por outros vetos ideológicos, como, por exemplo, o PL 3235 de 2015, de autoria de Marco Feliciano, que visa criminalizar comportamento que induza a ideologia de gênero. Neste debate, visamos defender a escola pública, laica e de qualidade e também entender porque o ‘Escola sem Partido’ surge justo nesse momento político do país”, concluiu a psicóloga.

Em seguida, Malvina ressaltou o caráter totalitário e radical do projeto em questão. “A ‘Escola sem Partido’ é, na verdade, a escola de partido único, e isso nos lembra uma escola de partido totalitário. Isso nos lembra o Nazismo. E o nazismo já vinha dando seus sinais antes de dominar tudo e pessoas como nós, lá na Alemanha, deveriam estar achando, como nós achamos do ‘Escola sem Partido’, ‘ah, isso não existe’. Mas, existiu. E matou milhares de judeus, negros, ciganos. Milhares de diferentes”.

“Isso é para percebermos que não estamos lidando com debates de ideias político-pedagógicas diferentes, de concepções de educação diversas. Estamos lidando com algo muito mais sério do que isso. Estamos falando de um conservadorismo enorme. Um tipo de conservadorismo que coloca a mulher, por exemplo, de forma degradante. Poderíamos estar simplesmente falando de uma proposta liberal, de meritocracia, eu até seria contra de qualquer forma, mas haveria discussão. Haveria um saudável debates de ideias. Mas não é disso que estamos falando”, concluiu a professora.

Já Leonardo sublinhou os mecanismo políticos menos óbvios e mais perversos que o projeto traz consigo. “Um dos bons combates que travamos no âmbito da Educação Básica foi o da aprovação do projeto político-pedagógico na LDB (Lei de Diretrizes e Bases), que prevê a participação ampla da comunidade dentro da escola. Isso foi uma vitória do povo brasileiro e da democracia. E é isso que eles estão querendo jogar para trás. Porque, quando a família está na escola e fazendo acordo com a escola, discutindo, participando, você cria condições para uma educação de mais qualidade e mais referenciada na comunidade onde está inserida. E isso eles não querem porque vai contra o projeto totalitário e hegemônico de educação. Para eles, a escola tem que ser o enquadramento do sujeito”.

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Breno Brizola, Fernando de Araújo Penna, Malvina Tuttman e Leonardo Castro (da esq. para dir.)

“O que esses caras não gostam é de democracia, pois a referência de escolas que eles tem, dita por eles mesmo, é a escola de 30 anos atrás, ou seja, a escola da época da ditadura. Essa é uma questão. Outra questão que quero tratar aqui é do ponto de vista político, uma jogada mais complexa e difícil de nós percebermos num primeiro momento. É o seguinte: os liberais que não são partidários destas ideias totalitárias radicais, estão deixando tudo rolar porque sabem que isso vai acabar chegando num conflito. E o que esse camarada faz? Ele incensa o conflito para depois poder negociar uma solução no meio, que estará próxima do que o liberalismo deseja. Ou seja, ao radicalizar à direita, a mediação e negociação encontrará uma saída mais a direita do que à esquerda. Daí teremos um projeto educacional mais conservador, quando o que estamos construindo e queremos é uma escola plural, democrática e participativa”, concluiu o professor.

Fernando, por sua vez, explicou detalhadamente o surgimento do movimento “Escola sem Partido” que culminou nos PLs em discussão. “O movimento ‘Escola sem Partido’ surge em 2004, criado por Miguel Nagib, e o primeiro projeto de lei foi apresentado por Flavio Bolsonaro em 2014 e também pelo vereador Carlos Bolsonaro na Câmara Municipal do Rio de Janeiro. O próprio advogado Miguel Nagib formulou o anteprojeto de lei municipal e lei estadual para serem apresentados pelo vereador e pelo deputado. E, atualmente, esse projeto já está tramitando nacionalmente, na Câmara e no Senado”.

“Esse projeto é uma chave de leitura do fenômeno educacional que tem alguns elementos principais, dentre eles uma concepção de escolarização que coloca que o professor não é educador, o professor não pode dialogar com a realidade do aluno, esse é o primeiro critério do professor doutrinador. O professor não pode passar nenhum tipo de valor quando está transmitindo um conhecimento neutro. Ou seja, uma desqualificação do professor, retirando dele o reconhecimento do seu saber educacional. Mais que isso, o professor é colocado como um parasita no qual os pais não devem confiar”, disse Penna ao explicar como foi pensado o projeto.

Penna contou ainda um dos motivos pelos quais Miguel Nagib, formulador do movimento “Escola sem Partido”, alegou ter para criar o projeto. “O criador do ‘Escola sem Partido’ apresenta que um dos motivos que o levou a criar o movimento foi identificar “Síndrome de Estolcomo” no comportamento escolar. Ou seja, o professor é o sequestrador intelectual e os alunos são suas vítimas. Quando um aluno defende seu professor é porque está sofrendo Síndrome de Estolcomo. Essa informação consta do site próprio movimento”, concluiu o educador.

Por fim, o estudante secundarista Breno Brizola trouxe uma visão diferenciada, mostrando como o aluno está encarando esse momento. “A nomenclatura ‘Escola sem Partido’ ou ‘Escola Livre’ são nomes que tentam maquiar o que esses projetos são de fato e o que tentam promover. A última coisa que o ‘Escola sem Partido’ é, é ser sem partido. A ‘Escola sem Partido’ é, na verdade, uma escola de partido único e a escola livre nada mais é que um paradoxo, porque propor uma escola livre através do totalitarismo e da obrigação, é justamente o contrário de ser livre. Podemos ver pelo movimento dos estudantes, por exemplo, nas ocupações que tivemos, que as reivindicações são justamente o oposto do que pede a escola sem partido. Pedimos, por exemplo, o aumento de aulas de Filosofia e Sociologia que visam justamente estimular o pensamento crítico, que é o que esse projeto quer exterminar”.

“O pior é que, no meu caso que sou de escola particular, preciso dizer que a escola sem partido já existe na rede privada, pois já existem as demissões de professores baseadas em concepções que vão contra a direção da escola. E nós temos que pensar numa escola como encontro das diferenças. A escola privada está sendo pensada simplesmente para formar um bom trabalhador para o mercado de trabalho. Isso vai de encontro à fala do presidente Temer quando disse, a respeito da crise, que não devemos pensar, devemos trabalhar”, alertou o estudante, encerrando a mesa.

 

 



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