“Psicologia e a queixa escolar” foi o tema proposto pela Comissão de Psicologia e Educação para a série de debates promovida pela Comissão Gestora do Norte – Noroeste Fluminense no dia 19 de agosto na subsede do CRP-RJ em Campos dos Goytacazes.
Participaram o conselheiro e membro da diretoria do CRP-RJ Rodrigo Acioli Moura (CRP 05/33761), as conselheiras e membros da Comissão Gestora, Fátima dos Santos Siqueira Pessanha (CRP 05/9138) e Denise da Silva Gomes (CRP 05/41189), a colaboradora Evelyn Rebouças de Gouvêa (CRP 05/41205) e a psicóloga da Comissão de Orientação e Fiscalização do CRP-RJ no Norte – Noroeste Fluminense, Michelle Ribeiro Henrique (CRP 05/37079).
Como palestrantes, marcaram presença os membros da Comissão de Psicologia e Educação (COMPSIEDUC) do CRP-RJ: a conselheira e presidente, Helena Rego Monteiro (CRP 05/24180), o antropólogo e cientista social Rui Harayama, a professora Aline Lima da Silveira Lage e o psicólogo e presidente do Sindicato dos Psicólogos do Rio de Janeiro, Marinaldo Silva Santos (CRP 05/5057).
“Decidimos revitalizar a Comissão de Psicologia e Educação e para isso estamos compondo um coletivo para reverberar a discussão da inserção do psicólogo no campo educacional, uma vez que temos constatado que esse debate pouco aparece no momento de formação”, afirmou Helena na abertura do evento.
“É importante destacar que as demandas do campo educacional estão presentes também em outras áreas da nossa atuação. Muitas vezes recebemos essa demanda em nossos consultórios através de crianças que são encaminhadas pela escola, por exemplo”, enfatizou a conselheira.
Marinaldo ressaltou a importância de refletirmos sobre a história da prática da Psicologia em contexto escolar ao longo do tempo. “Se olharmos para trás, veremos que na década de 1980, a prática do psicólogo no universo escolar estava mais voltada para a avaliação psicológica e pelo uso de testes na tentativa de ajustar a conduta das crianças dentro dos padrões de normalidade vigentes. Atualmente, essa prática vem sendo, felizmente, modificada pelos profissionais”.
Aline, por sua vez, afirmou que “estar aqui, neste evento, é uma forma potente de pesarmos quais os papéis e demandas têm sido apresentadas aos psicólogos no espaço escolar e de que forma esses profissionais vêm encaminhando essas questões”.
“O psicólogo, cada dia mais, vem desempenhando essa posição intermediária dentro das políticas públicas, e essa atuação tem de ser feita de forma crítica”, ponderou Rui. “O posicionamento passivo do profissional diante das políticas públicas pode ser tão estigmatizante quanto as práticas de ajustamento social”.
Em seguida, para fomentar o debate, foi exibido o filme “olhar-professor” produzido por Helena Rego Monteiro durante suas pesquisas para o doutorado com o objetivo de pensar segundo a autora “nos efeitos das relações de saber-poder instituídas no universo escolar e na emergência de um certo olhar docente, ou seja o filme quer pensar o que faz com que certas “verdades” dominem, criando um crivo no olhar-professor.”
“Temos que discutir como que certos enunciados reificam um determinado regime de verdade a maneira pelas quais tais verdades são efetivadas no campo educacional. O discurso dos professores foi visto como um meio pelo qual algo se configura como uma ‘verdade’. Que ‘verdades’ estão sendo colocadas em cena no universo escolar?”, acrescentou Helena ao término do vídeo. “Geralmente, é dito que os alunos são desatentos, bagunceiros, indisciplinados, desobedientes, incapazes ou anormais. É preciso pensar de onde vem isso, porque esse olhar não nasce com o professor. Quando passamos a analisar criticamente essas engrenagens, percebemos as forças discursivas que se produzem nesse espaço e para além dele”.
Helena falou, ainda, dos processos de psicologização ou psiquiatrização das demandas escolares, fatores que fortalecem o discurso da medicalização. “Muitas vezes, quando prescrevemos a um aluno uma terapia ou fazemos determinada intervenção, estamos medicalizando aquela determinada demanda. Não prescrever fármacos apenas não significa que não há medicalização, que está atrelada também à mercantilização de determinados modos de ser e estar no mundo”.
“Esse contexto de medicalização produz rótulos que o aluno carrega, e isso acaba despotencializando a escola no processo de aprendizagem. As escolas, como um todo, já não estão mais dando conta de encaminhar as demandas desse aluno, marginalizando a potência desse aluno”, enfatizou Aline.
“Muitas vezes”, complementou Marinaldo, “o profissional é capturado pela própria demanda da escola e não pensa criticamente sua atuação nesse espaço, caindo na armadilha da produtividade, da necessidade do maior número possível de encaminhamentos a qualquer custo”.
Rui destacou a importância de se voltar o olhar para as necessidades da criança e do adolescente no espaço escolar. “É preciso dar a voz a essa criança e adolescente porque esquecemos muitas vezes o que é ser, de fato, criança e adolescente, e acabamos impondo o nosso olhar e nossos modelos”.
Por fim, Fátima afirmou que “o próprio sistema acaba fragilizando e adoecendo os professores, que, por sua vez, acabam se vitimizando, permanecendo no lugar da queixa. Nesse processo, o professor acaba sendo emburrecido diante das demandas próprias da infância e da adolescência. Ao invés de perguntarmos ‘que crianças são essas que temos encaminhado?’, temos de perguntar ‘que encaminhamentos são esses que damos a essas crianças?’”.
Ao término do encontro Rui falou sobre como aderir ao Fórum sobre Medicalização da Educação e da Sociedade e distribuiu as Recomendações de Práticas Não-Medicalizantes para Profissionais e Serviços de Educação e Saúde, um produto das discussões do GT Saúde e Educação do Fórum disponível para download em http://medicalizacao.org.br/recomendacoes/.