auto_awesome

Noticias






O FUTEBOL FEMININO NÃO FALA SÓ DE ESPORTE, MAS TAMBÉM SOBRE REPRESENTATIVIDADE E LUTA POR DIREITOS. REFLEXÕES PARA A PSICOLOGIA


Data de Publicação: 16 de agosto de 2023


“Quando comecei a jogar, eu não tinha ídolo no feminino. Vocês não mostravam jogo do feminino, como que eu ia ver? Hoje a gente sai nas ruas, as pessoas param e falam ‘minha filha te adora, ela quer ser igual a você’. Se tivesse parado nos obstáculos, isso não teria acontecido. É uma persistência contínua que não começou comigo, começou com muita gente lá atrás e a gente tem muito orgulho. Há 20 anos, em 2003, ninguém conhecia a Marta e hoje a gente é referência pra muitas mulheres no mundo inteiro. A gente acabou abrindo portas”.
 
A fala da jogadora Marta, eleita seis vezes a melhor jogadora de futebol do mundo, em uma coletiva com jornalistas, fala de representatividade e de uma luta não só para que mulheres pudessem jogar futebol, mas de conquistas de direitos sobre seus próprios corpos.
 
A história do futebol feminino no Brasil é antiga: data do final do século XIX, mas foi no início do século XX, nos anos de 1920 a meados dos anos 1930 que as mulheres começam a desbravar esse campo. As partidas, compostas por mulheres, em sua maioria, da classe trabalhadora e camadas mais populares, começam a ganhar uma certa projeção, movimentando forças conservadoras legitimadas pelo Estado e pelo discurso médico – e retroalimentados pelas mídias esportivas – que trabalharam incessantemente pela criminalização e proibição da prática do futebol pelas mulheres desde 1930 até o início da década de 80.
 
Foram 50 anos de uma lei que dizia que a prática do futebol por mulheres era “incompatível com sua natureza”, mais 60 anos para que a seleção feminina de futebol tivesse, atualmente, na Copa do Mundo de 2023, uma estrutura e um planejamento pensado somente para a equipe. Durante esse tempo, mesmo durante a proibição, mulheres e meninas continuavam a jogar, fossem nos campinhos, na rua, ou em clubes, enfrentando não só a falta de investimento, mas também estigmas, violências, e a falta de um olhar diferenciado para as mulheres atletas. Recentemente, em 2023, foi aprovada a licença maternidade para mulheres atletas sem que elas corram o risco de perder seus contratos ou pontuações e posições no ranking em outras modalidades esportivas.
 
Os discursos que deslegitimam a ocupação de determinados espaços na sociedade por mulheres com base no gênero têm, cada vez mais, sido confrontados por movimentos feministas que reivindicam que o lugar da mulher é onde ela quiser. Ainda que a conquista de direitos esteja constantemente em disputa, podemos dizer que esses movimentos não darão passos para trás e seguirão lutando para que as mulheres ocupem todo e qualquer espaço.
 
Em meio a esse trajeto, a psicologia esportiva teve atuação dentro das comissões técnicas da seleção feminina, inicialmente com a presença da psicóloga Daniela Cury, nos anos de 1995-1996, “abrindo o campo” para outras psicólogas da área que atuaram posteriormente: Maria Helena Rodriguez (2001 a 2012, participando do ciclo prata olímpica Athenas 2004) e Adriana Amaral (com jogadoras que contratadas das Forças Armadas), profissionais que atuam no RJ, e Marina Gusson (atual psicóloga da seleção feminina, atuante desde o ano de 2019).
 
Enquanto ciência e profissão, a Psicologia tem um compromisso com o combate às desigualdades de gênero e as muitas intersecções que as compõem, e esse compromisso também se faz presente no esporte, uma vez que entendemos que podemos contribuir para uma reflexão crítica acerca do modo como essas desigualdades constituem manifestações culturais e sociais tão importantes para a sociedade brasileira.
 
Com esse breve relato sobre o futebol feminino, entendemos que todos os constrangimentos sofridos por essas mulheres atletas, falam de todas e todes nos mais diversos espaços de trabalho e da sociedade. Desse modo, reafirmamos uma psicologia que atua na garantia desses direitos e na garantia de que mais meninas e mulheres tenham não só visibilidade, mas principalmente soberania sobre suas existências.


WhatsApp-Image-2023-08-16-at-2.43.51-PM-300x300.jpeg